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15 abril 2020
Texto de Sandra Costa Texto de Sandra Costa

O Verão de todas as incertezas

​​​​​​A quebra no turismo pode ameaçar a sustentabilidade da farmácia. Mas agora é tempo de cuidar de quem precisa.
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​​Farmácia Oceano (Ribamar)

A aldeia de Ribamar, a três quilómetros da Ericeira e meia hora de Lisboa, é conhecida pelas praias e pela gastronomia. No Verão, o turismo anima a pequena estância balnear onde moram menos de 2000 pessoas, sobretudo idosos. A dois meses da abertura da época balnear, não se sabe ainda que Verão será este. Em tempos de incerteza, vive-se o presente. É assim também na Farmácia Oceano, a única da freguesia de Santo Isidoro, no concelho de Mafra. 

As vendas de Verão representam uma parte significativa do negócio da farmácia. «É quando temos mais movimento e trabalho», confirma o farmacêutico António Geraldo. O filho da directora-técnica, Miquelina Geraldo, sabe que o prolongamento da pandemia do COVID-19 pode ter um impacto sério no negócio da farmácia. Mas prefere centrar-se no presente e, para já, não falta trabalho. Além dos utentes habituais, sobretudo idosos, a farmácia está a servir muitas pessoas que têm na aldeia uma segunda casa e ali escolheram passar a quarentena. 



A Farmácia Oceano continua a atender de porta aberta. As placas de acrílico protegem a equipa, os utentes aguardam na rua a sua vez. Entre cada atendimento desinfectam-se mãos e balcões. A equipa é pequena, não é possível dividirem-se por turnos. «Somos quatro pessoas, e outra a tempo parcial. Continuamos todos, correndo o risco de ter de fechar a farmácia, caso um seja infectado». Mantêm-se firmes porque, como diz António, «é importante manter este serviço à comunidade». Tem havido muita procura por parte de pessoas com problemas dentários, agora sem consultas, e problemas nervosos, motivados pelo medo. Quando pode, a farmácia ajuda se não consegue resolver encaminha para o centro de saúde da Ericeira- A extensão de saúde de Santo Isidoro encerrou.   

Já passaram por várias fases. Logo após os primeiros casos de COVID-19 em Portugal foi a «corrida desenfreada a alguns produtos» como paracetamol, ibuprofeno, bombas respiratórias ou produtos para a diabetes. «Alguns doentes crónicos compraram medicação para seis meses ou um ano», conta António. A farmácia chegou a ter falta de alguns medicamentos e mantém-se a dificuldade de encontrar materiais de protecção individual. O farmacêutico queixa-se dos «preços inflacionados» apresentados pelos armazenistas para as máscaras, álcool gel e luvas. 

Muitas pessoas optam por fazer as encomendas por telefone e e-mail. A Farmácia Oceano prepara-se para aderir às entregas ao domicílio negociada pela Associação Nacional das​ Farmácias (ANF) e os CTT Expresso. O farmacêutico considera «uma excelente iniciativa para que as pessoas possam continuar a fazer a medicação habitual sem saírem de casa, seguindo as recomendações da Direcção-Geral da Saúde». A par, mantém as entregas domiciliárias gratuitas aos clientes habituais, sobretudo idosos que não querem ou não podem deslocar-se à farmácia. Alguns lares passaram a preferir encomendar pelo telefone e receber ao domicílio, para minimizar os riscos para os utentes. 



Leonardo Oliveira é proprietário de uma casa de repouso em Ribamar. Da equipa de sete pessoas é o único que sai das instalações, uma vez por semana, para comprar alimentos e medicamentos. Os restantes não vão a casa desde a segunda semana de Março. Quando regressa toma banho antes de se juntar aos utentes. «É um esforço enorme, mas resolvemos não correr riscos. A maioria dos 18 utentes tem doenças crónicas». Leonardo combina ao telefone com António ou Miquelina a melhor hora para pegar os medicamentos. «Eles sabem a minha situação e facilitam-me tudo. É uma equipa fantástica». De uma vez que não conseguiu insulina, António falou com outro cliente e conseguiu «uma caixa». 



Na aldeia conhecem-se todos. Áurea Rendas é cliente da Farmácia Oceano desde que abriu, há mais de 20 anos. Há cinco semanas que a antiga cozinheira e o marido, pedreiro, vêem a rua da varanda. Tomam medicação todos os dias para a asma, problemas respiratórios, hipertensão. Não precisam da farmácia para entregar em casa. O filho mais novo, pintor, deixou o trabalho para tomar conta dos pais. Áurea tem medo, mas sente-se protegida. «Sou uma pessoa positiva, tento dar força ao meu marido: O que importa é conseguirmos ultrapassar isto tudo sem adoecermos. E ele concorda». Sente-se grata. À farmácia também. «Só tenho a agradecer. São muito boas pessoas. Já tive momentos muito ruins na minha vida, não tinha como pagar os medicamentos e eles ajudavam-me, ia pagando como podia». Hoje, como sempre, é nos momentos difíceis que percebemos com quem contamos. 
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