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10 agosto 2020
Texto de Sandra Costa Texto de Sandra Costa Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro

Termas encantadas

​​​​​​​​​Visitar a Curia, o Luso e o Bussaco é viajar no tempo de festas elegantes, concursos de vestidos de chita e passeios nas florestas exuberantes.

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O Curia Palace Hotel Spa & Golf ergue-se imponente, ladeado pelo jardim ao estilo francês. Ao lado, o muro com ameias em jeito de castelo anuncia a entrada no Hotel e Parque das Termas da Curia. Entre a vegetação exuberante sobressaiem o chilrear dos pássaros, o canto das cigarras e o perfume intenso das tílias e das roseiras de Santa Teresinha. O cenário é mágico, a sensação é a de ter viajado no tempo até às primeiras décadas do século XX. 


As Termas da Curia estão inseridas num parque arborizado, que inclui o maior lago artifical da Península Ibérica

Não é difícil imaginar a atmosfera estimulada pelas termas que, entre a Páscoa e o final do Verão, atraía à Curia a nata da sociedade portuguesa. Famílias inteiras que, a pretexto dos tratamentos termais, ali se alojavam durante duas, três ou mais semanas. Durante o dia deambulavam entre as majestosas árvores do parque ou em passeios de barco no maior lago artificial da Península Ibérica. Ao anoitecer, vestiam as melhores roupas para se divertirem no casino, no cineteatro, na sala de chá ou nos glamorosos bailes organizados pelo Curia Palace Hotel. Havia concursos de vestidos de chita, passeios a cavalo, torneios de natação, esgrima e ténis, celebrava-se a festa das vindimas. «Era um ambiente muito elegante e distinto», confirma Maria Manuel Silva, proprietária da Farmácia Termal. A Curia estival que conheceu a partir da década de 70, tempos menos elitistas, não era menos animada.


Maria Manuel Silva, farmacêutica, na escadaria da Fonte Fria, na Mata Nacional do Bussaco

Quase um século depois, a Curia permanece um destino de charme para quem quer umas férias relaxantes, fugindo às opções tradicionais de praia. O hotel Curia Palace continua a receber a visita daqueles que, ainda crianças, correram pelos seus jardins e hoje trazem os filhos, netos e bisnetos, num ritual de perpetuação. Para muitos bairradinos é a escolha natural para os momentos importantes da vida. Foi aqui que Maria Manuel Silva se casou. É inequívoca a ligação sentimental ao hotel criado em 1926, expoente máximo da Arte Nova, que mereceu cinco Prémios Valmor.


O Curia Palace reabriu em 2011, depois de uma remodelação que preservou a traça e os objectos de origem

Basta transpor as enormes portas de madeira e vidro, encimadas por vitrais coloridos, para perceber porquê. Em 2011, o hotel reabriu depois de uma remodelação que preservou a traça e os objectos de origem. O elevador em ferro forjado, as escadarias atapetadas em vermelho e dourado, o mobiliário, os lustres, os vitrais, o cheiro a cera tradicional que emana do chão de madeira. «Sentimos o respirar de um hotel dos anos 20», resume Elisabete Saraiva, directora do hotel. Aqui funcionou o primeiro posto de correios da Curia, o acesso ao moderno spa faz-se passando pela antiga central telefónica do hotel, por todo o lado documentos e fotografias recordam a época áurea do Palace. É como visitar um museu, com o privilégio de nele viver temporariamente. 

A magia continua do outro lado da rua, ao longo dos 14 hectares arborizados do parque, nas pontes tecidas de troncos e nos recantos e túneis construídos em pedra. Convida ao passeio, a pé, de bicicleta ou pedalando as gaivotas no lago. «O parque está feito para as pessoas se evadirem», confidencia a professora da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, que guarda do parque boas memórias. No Verão, é lá que decorrem os eventos musicais e culturais. No edifício termal centenário, as águas ricas em sulfato de cálcio e sulfato de magnésio são uma resposta natural para problemas renais, apesar das recentes alternativas farmacológicas, e mantêm a relevância terapêutica no caso das doenças reumáticas e musculoesqueléticas.

A 15 minutos de automóvel, o Luso, com os seus palacetes e casas de época trepando a colina da Serra do Bussaco, é uma referência pela excelência da água. Quem por ali vive tem o hábito de abastecer-se no fontanário. «É a água mais leve, pode beber-se uma barrigada. Tem o sabor da água». Sérvio Melo sabe do que fala: durante 30 anos trabalhou nas Termas do Luso. 


O Palace do Bussaco, antigo palácio de caça de D. Carlos, é hoje um hotel de cinco estrelas

Chegados ao Luso, é olhar para cima e percorrer mais meia dúzia de quilómetros. Na Serra do Bussaco há uma floresta encantada, de uma riqueza natural, arquitectónica e cultural só equiparada à de Sintra. As semelhanças não são fortuitas. No final do século XIX, Dona Maria Pia quis ali recriar uma «pequena Sintra», explica Sofia Ferreira, dos Serviços Educativos da Fundação Mata do Bussaco. Passou-se de um Bussaco austero, marcado desde o século XVII pela vivência em isolamento dos frades Carmelitas Descalços, para um Bussaco romântico, que acolheu a corte de D. Carlos. O Palace do Bussaco, antigo palácio de caça do rei, é hoje um hotel de cinco estrelas. A arquitectura em estilo neomanuelino é do italiano Luigi Manini, que também assinou a Quinta da Regaleira, em Sintra.


O Convento de Santa Cruz, de 1628, traz à memória o Bussaco austero do tempo dos frades Carmelitas Descalços

Vale a pena entrar no Convento de Santa Cruz e percorrer a Via Sacra feita à escala da original, em Jerusalém. Embrenhar-se nos 105 hectares de mata, percorrer o trilho de fetos do tamanho de árvores, oriundos da Tasmânia, e desembocar na escadaria da Fonte Fria. Atravessar as Portas de Coimbra, decoradas com pedras brancas e negras, onde estão inscritas duas bulas papais, e subir à Cruz Alta, a floresta mais antiga da mata. Logo ali ao lado, o Museu Militar do Bussaco guarda a memória da Terceira Invasão Francesa, quando em 1810 as tropas anglo-lusas infligiram pesadas baixas aos homens do marechal Massena. Conta o major Lino Graça, do Exército Português, que os Carmelitas Descalços ajudaram ambas as facções, numa lógica humanitária pouco usual à época. 


O Museu Militar do Bussaco retrata a Terceira Invasão Francesa, em 1810

Por aqui, o convívio faz-se em torno da mesa. «Come-se bem na Bairrada», garante Maria Manuel Silva. O leitão à moda da Bairrada é uma instituição nacional e sabe melhor ainda acompanhado por um espumante da região, «um dos melhores do mundo». Os vinhos da adega Campolargo são exemplo da crescente qualidade e reconhecimento que os vinhos da Bairrada ganharam nas últimas décadas. Da varanda que circunda a sala de provas avista-se um mar de verde. São 160 hectares de vinha, em duas propriedades. Ao fundo, o contorno das serras do Bussaco, Caramulo e Estrela. 

​​Não se pode ir à Bairrada sem provar o leitão​

O fim do dia apanha o viajante de corpo farto e alma cheia. A brisa quente agita as folhas das árvores, as andorinhas rodopiam em voo picado, parecendo dizer, simplesmente: «Até breve!».

 

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