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11 novembro 2019
Texto de Sandra Costa Texto de Sandra Costa Fotografia de Ricardo Castelo Fotografia de Ricardo Castelo

Vamos brindar

​​​​​​​​​​​​​Quase toda a gente de Monção tem um bocadinho de vinha, nem que seja no quintal.

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A paisagem é feita de vinhas a perder de vista, de um lado e do outro da estrada. Filas contínuas de videiras, as cepas altas afastadas do chão, protegidas da humidade. Hoje, como outrora, o verde é a cor de Monção. A vinha tornou-se quase uma monocultura, substituindo a vinha de bordadura que emoldurava os campos de milho, a cultura tradicional do Alto Minho.  O motivo é simples: a vinha, em especial a produção de Alvarinho, é muito mais rentável.

Em Monção fez-se pela primeira vez, no início do século XX, um vinho monovarietal (de casta única) com a casta nobre dentro das castas brancas. Nos últimos anos, o vinho Alvarinho criou fama e ganhou adeptos. É o grande motor de desenvolvimento da sub-região de Monção e Melgaço, uma das nove sub-regiões da Região Demarcada dos Vinhos Verdes.


Fundada em 1958, a Adega Cooperativa Regional de Monção reúne 1.600 produtores dos concelhos de Monção e Melgaço 

Quase toda a gente tem um bocadinho de vinha, nem que seja no quintal. Alguns fazem deste cultivo o principal modo de vida, a maioria ocupa-se noutras profissões. São professores de liceu, funcionários do tribunal, têm uma loja ou um café na vila. Na pequena propriedade de família plantam um pedaço de vinha. «Há essa tradição e esse gosto», explica Armando Fontaínhas. O responsável pela Adega Cooperativa Regional de Monção sabe do que fala. Dois terços dos 1.600 cooperantes da adega possuem menos de um hectare. Este é o território do extremo minifúndio.

Durante a época das vindimas, a vila quase pára. As lojas e os cafés ficam vazios, diminuem não há consultas no centro de saúde. Nas estradas circulam tractores carregados, deixando no ar o aroma da uva acabada de colher. As pessoas encontram-se nos campos. Famílias inteiras, amigos e vizinhos juntam-se a vindimar. Num dia na propriedade de um, no dia seguinte na de outro. A interajuda é grande, para suprir a falta de mão-de-obra.  


O médico Henrique Ribeiro numa das ruas da vila onde o granito se impõe

A vindima é uma «grande festa comunitária», que celebra o culminar de um ano de trabalho, garante o médico Henrique Ribeiro, natural de Monção. No passado, até as crianças participavam, a apanhar o "baguinho” (os bagos que caíam ao chão). «Lembro-me sempre daquela frase que incentivava as crianças a apanhar muitos bagos: “Menino, só de bagos fez uma velha cem pipas”». O provérbio continua na memória dos produtores monçanenses, mas hoje é difícil convencer as crianças a colaborar, ri o pequeno agricultor Evaristo Vilarinho, do alto do seu tractor.


O cordeiro à moda de Monção venceu o concurso ​ "7 Maravilhas à Mesa" em 2018 

Um bom ponto de partida para conhecer o Alvarinho é visitar o museu com o mesmo nome, na chamada Casa do Curro, mesmo no centro da principal praça da vila, a Praça Deu-la-Deu. Ali pode perceber-se o trabalho de cultivo da vinha, conhecer os produtores da região e provar o vinho, acompanhado de um bolo típico. As roscas foram premiadas este ano como uma das “7 Maravilhas Doces de Portugal". Se preferir, escolha um Alvarinho para acompanhar a refeição de cordeiro à moda de Monção, conhecido como “Foda à Monção", que venceu o concurso "7 Maravilhas à Mesa" do ano passado.

Há 40 anos havia uma ou duas marcas de Alvarinho, hoje são mais de 50. Qualidade garantida tem o Alvarinho Deu La Deu, com a chancela da adega de Monção, assegura Henrique Ribeiro. A maior marca da região, conhecida em todo o país, é Muralhas. Este vinho mistura o Alvarinho com um bocadinho de trajadura (casta de uva branca do Minho). Para receber ou presentear alguém, o médico elege o Alvarinho Palácio da Brejoeira. «É a marca top», explica.


Hermínia Paes, na foto à esquerda, foi a terceira proprietária do Palácio da Brejoeira, seu lar desde a década de 60 

O imponente palácio do início do século XIX está cercado por vinha. São 18 hectares de Alvarinho mandados plantar pela terceira proprietária, Hermínia Paes, lisboeta tornada monçanense. Oferecido pelo pai como prenda de maioridade, o palácio foi o seu lar desde a década de 60. É o mais majestoso edifício da região. Na origem esteve a ambição de replicar o Palácio Nacional da Ajuda. Até alberga um quarto do rei. Em 2010, abriu as portas ao público. Vale a pena demorar o olhar pelos azulejos tradicionais portugueses, com imagens alusivas às mitologias grega e romana, grega e romana, e apreciar o teatro privado, onde se deslocavam as companhias portuenses para deleite dos convidados. A visita começa nas escadarias de granito, passa pelo jardim de Inverno, a biblioteca e o grande salão de refeições. Segue-se a capela, o bosque e os jardins em estilo inglês.


O Palácio da Brejoeira, construído no início do século XIX, é o mais majestoso edifício da região 

A vila abriga-se no vale do rio Minho, circundada por uma cordilheira de montanhas que se estende até ao sopé da Peneda-Gerês. Junto ao rio, a ecopista percorre 18 km até Valença, no espaço da linha do comboio desactivada. Ao final do dia são muitos os que a aproveitam, sobretudo galegos de Salvaterra de Miño. Os dois quilómetros de distância não chegam a separar as duas comunidades. Monção está «constantemente pejada de espanhóis», confirma Henrique Ribeiro. Recorda, desde sempre, boas relações com Espanha, mesmo quando a fronteira estava fechada. «Os monçanenses são os mais galegos de todos os portugueses e os de Salvaterra são os mais portugueses de todos os galegos», resume. A proximidade à Galiza favorece o comércio e o turismo. Os galegos são boa parte do público da prova de ciclismo Monção e Melgaço Granfondo by Trek, que na segunda edição, em Setembro, atraiu mais de dois mil participantes. Por sua vez, Vigo e o aeroporto a apenas 30 quilómetros garantem fácil acesso ao mundo.


A Torre de Lapela é tudo o que resta do castelo medieval destruído durante a Guerra da Restauração

Na margem do rio, o Parque das Caldas é zona de lazer, com mesas de piquenique à sombra das árvores. O espaço acolhe várias festividades, como a Feira do Alvarinho, em Julho. Ali perto situam-se os três edifícios que desde o século XVII marcam a vocação termal de Monção. Daí ao centro histórico é uma caminhada de dez minutos subindo junto à muralha de origem fernandina, alargada no século XVII com pedras dos castelos medievais de Monção e de Lapela, aldeia das redondezas, destruídos durante a Guerra da Restauração. Ao longo de cinco quilómetros, o granito faz-se muralha num miradouro que circunda o centro histórico. Estende-se à fachada dos edifícios, debrua portas e janelas, eterniza-se em fontes, mesas e bancos de jardim que assistem ao desenrolar tranquilo da vida minhota. Em baixo, plácido, o rio faz o seu caminho até ao Atlântico. 

 

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