António Francisco dos Santos, Adriano Monteiro Cardoso e José Guedes entraram juntos para o seminário, em Lamego, em 1959. Desde então, persiste uma amizade que rompe, inclusive, os limites da vida.
Entre os amigos, António Francisco era o Chiquinho, trato devido ao porte franzino, mas também ao carinho que lhe tinham e «de que ele foi merecedor desde a primeira hora», revela o padre José Guedes. É ele quem nos conta que os três faziam parte de um «grupinho» mais alargado de seis rapazes, companheiros de um percurso de 12 anos de ensino.
D. António Francisco dos Santos nunca hesitou quanto ao sacerdócio, garante o Padre José Guedes
«O António sobressaía, mesmo na turma. Era um homem superior!». José Guedes sublinha-lhe as capacidades analítica e sintética: «Brincávamos com ele, em Teologia: “Resume lá a matéria, que temos aula amanhã e não tive tempo”. E ele tinha sempre a porta aberta para nos ajudar, sempre afável»; Adriano Cardoso, a memória: «Era o único seminarista que, desde pequenito, sabia o nome de todos os ministros de Portugal e de todos os bispos da Igreja».
Nos recreios, as brincadeiras exteriores não eram o seu forte. Pião, arco, ou jogos de equipa, como o futebol e o basquetebol, nunca o entusiasmaram muito. «E nós éramos um bocado brutos», recorda o padre Adriano, com um sorriso, aludindo ao Jogo da Coca, em que para atingir a meta um jogador tem de atravessar um corredor formado pelos outros, enquanto se tenta escapar dos tabefes distribuídos à abundância. «Às vezes doía! (risos) Mas ele, nada. Não era para ele, aquilo. O António gostava, essencialmente, de jogos de tabuleiro». E de conversar, debater ideias. «Cedo começámos a discutir temas mais sérios. Parecíamos os peripatéticos que se passeavam com o Aristóteles, só que tanto falávamos de Religião e Educação, como de futebol».
O Padre Adriano recorda que D. António preferia os jogos de tabuleiro e uma boa conversa a jogar futebol
À medida que amadureciam, assim acontecia com os temas de conversa. Adriano faz notar que viviam numa época em que o Concílio do Vaticano II já tinha terminado. «Nós estávamos num seminário que tinha gente muito competente, mas que não estava ainda suficientemente aberta à nova dimensão». Coube a estes peripatéticos, ao seu esforço pessoal, encontrar formas de saciar a curiosidade e meios para descobrir o mundo que se desenrolava lá fora. «Organizámos grupos de estudo, uma espécie de academia nossa, para ter conhecimento dos documentos fundamentais do Vaticano e estarmos a par das coisas». Mostra a revista “Selecciones de Teologia”, de que é assinante há quase 50 anos, desde o oitavo ano. «Eu estava à frente da biblioteca no seminário e assinei-a. De três em três meses, traz os melhores artigos de Teologia das diferentes Igrejas, não só da Católica. Éramos abertos contra um mundo fechado». Sonhavam com um sacerdócio de contacto e envolvimento com as pessoas, ao invés de uma igreja apenas assente apenas nas práticas sacramentais. «Queríamos uma Igreja dinâmica, conduzida pelo espírito, onde os leigos tinham um lugar importante. Saímos do seminário entusiasmados».
Foram ordenados padres em Dezembro de 1972. Dois, entretanto, abandonaram o sacerdócio, fizeram outras opções de vida, e um terceiro, Adelino, o mais velho, faleceu. «Padres, ficámos só os três», diz José Guedes. Na sua percepção, D. António nunca sentiu qualquer hesitação em relação ao sacerdócio. «Malabaristas seríamos eu e os outros, que andámos um bocado indecisos. Ele sempre levou muito a sério o trabalho, as aulas, a sua valorização. Teve sempre muitas certezas do caminho que queria seguir».
Seminário de Lamego, onde D. António Francisco do Santos ingressou em 1959