Entrar pela primeira vez na Universidade Lusófona, em Lisboa, é uma experiência surpreendente. É uma cidade dentro da cidade, com vários edifícios, escadas, arcos, caminhos labirínticos e gente de todas as raças, línguas e estilos de vestir. Os aviões passam uns atrás dos outros, de barriga à mostra para se fazerem à pista. Estamos no Campo Grande, ao lado do Aeroporto Humberto Delgado.
Para o 3.º ano, o dia começa com Imunologia. Por fora, a sala de aula parece um contentor, por dentro revela-se um laboratório moderno e espaçoso. Há vários elementos da Associação de Estudantes (AE) de Ciências Farmacêuticas com os olhos postos nos professores Tânia Almeida e Nuno Saraiva. A presidente, Joana Moreira Pereira, de 22 anos, não é um deles. Este ano decidiu fazer as cadeiras do 3.º ano que deixou para trás e avançar apenas com algumas do 4.º, tudo para ter disponibilidade para o cargo. Assim, só tem aulas uma vez por semana. Era «o ano ideal» para concorrer. Ganhou a aposta, porque a lista dela «felizmente» ganhou as eleições. Joana tem há muito «o bichinho do associativismo». Na escola secundária foi presidente duas vezes.
Joana espera até ao fim da aula por Filipa Gameiro, Inês Pereira, Miguel Raposo e Helena Melo. Quer a companhia deles para fazer uma apresentação completa da AE. Andá- mos por escadas e passadeiras metálicas até que chegamos a uma sala pouco maior do que um arrumo, onde a custo cabe a mesa de reuniões da Direcção. «Entrem, entrem!», convida Joana. «O espaço é curto, temos de ser organizados, mas é o nosso espaço». Há algo de orgulhoso no modo como pareceu cantar as últimas palavras. Em breve vamos perceber porquê.
Por comparação com outras AE – do universo da Lusófona e das outras faculdades de Farmácia – a associação é jovem, com apenas 17 anos. E também mais pequena. O curso já chegou a ter 500 alunos. «Agora, só representamos 142 pessoas», observa Miguel, 23 anos, vice-presidente com as Relações Externas. É a crise. E também o facto de Ciências Farmacêuticas ser o terceiro curso mais caro da Lusófona. «Acima de nós, só Medicina Veterinária e Engenharia Aeronáutica», especifica Helena, 21 anos, do Departamento de Relações Internacionais. Para agravar as coisas, houve «aquela confusão do Relvas e das praxes do Meco», lamenta Miguel. «Ou seja, apanhámos com toda a má publicidade». Nos últimos três anos, os números são débeis, mas mostram uma tendência de crescimento: 15 matrículas em 2014, 20 em 2015, 40 no último ano.
Os estudantes de Ciências Farmacêuticas eram apenas um núcleo da Associação Académica. Autonomizarem-se foi um acto de rebeldia. Achavam-se «totalmente dependentes», mas às tantas perceberam que tinham «asas para voar» por conta própria. «Saímos», resume Joana. «Somos pequenos, é verdade, mas conseguimos enfrentar e ultrapassar os grandes, somos um outsider», assegura a presidente. Compreendemos agora que a sala exígua é um símbolo de liberdade. A AE tem 19 elementos a representar 142 alunos. Na Universidade Lusófona, só aconteceu o mesmo no curso de Veterinária.
A relação com a Associação Académica já teve dias melhores. «Avisam-nos das actividades que promovem, nós fazemos eco, mas participamos pouco». O Arraial Lusófono é uma excepção, mas com acções próprias. A Semana das Ciências Farmacêuticas, de resto, é o grande momento de afirmação dos estudantes de Farmácia. Montam uma grande tenda no campus, onde oferecem rastreios e consultas de dermofarmácia, dermocosmética e saúde oftálmica. «Trabalhamos o ano inteiro para chegar a essa semana», enfatiza Joana. Mas vale a pena. Conseguem juntar facilmente 500 a 600 pessoas.
Ao longo do ano, promovem palestras, seminários, workshops e diversas acções de formação, in e outdoor. Também há rastreios. A professora Ana Sofia Fernandes ajuda os alunos a prepararem-se para fazer um com um aparelho novo: «Mãos lavadas, luvas… codificação da máquina… Correu tudo bem com as canetas na semana passada?».
A AE apoia ainda os programas de estágio e intercâmbio. A vida académica também é festa. Há jantares, convívios e torneios. O financiamento chega dos patrocínios, permanentes ou pontuais, directamente ligados às actividades desenvolvidas. «Não recebemos dinheiro da universidade, mas sim outro tipo de ajudas», conta Inês, 21 anos, do Departamento de Formação e Ensino. O aluguer da tenda para a Semana das Ciências Farmacêuticas é o melhor exemplo disso.
Com tantas actividades, que tempo sobra para o curso? «É preciso gerir muito bem o tempo, porque o nosso currículo é muito prático e a avaliação é contínua, ou seja, não dá para faltar às aulas», comenta Filipa, 22 anos, secretária da AE, que está convencida das vantagens do sistema. Miguel conta uma história diferente. Passa «mais tempo na faculdade do que em casa». E confessa que tem de faltar a algumas aulas e roubar horas ao estudo por causa da AE. Os pais não sabem, ou preferem deixar correr.