A Cooperativa de Ensino Superior Egas Moniz tem dois braços: o Instituto Superior de Ciências da Saúde e a Escola Superior de Saúde. O instituto oferece mestrados integrados, a escola cursos politécnicos. Cada braço tem à mão uma associação de estudantes que, por sua vez, integra núcleos dos vários cursos. São os dedos.
O Núcleo de Estudantes de Ciências Farmacêuticas (NECF) reporta à Associação de Estudantes (AE) do Instituto Superior de Ciências de Saúde. É a AE que põe de pé as actividades lúdicas e culturais. No entanto, tudo o que se relaciona especificamente com a área de Farmácia é da responsabilidade do NECF. Simpósios, seminários, workshops, rastreios e toda a actividade formativa extracurricular.
Na vida real, não tem sido exactamente como deveria ser. «Isto está um caos», desabafa Sofia Pintado. «Passamos a vida a ouvir críticas», acrescenta a responsável pelo Departamento Comercial e de Marketing do NECF.
«Às tantas, já nem importa», continua, desanimada. No seu discurso, só um nome contraria o pessimismo. «Se não fosse a Jéssica…».
Jéssica Pacheco é a presidente do NECF. Tem 21 anos, está no 2.º ano do curso e não tinha quaisquer ambições associativas. Colaborava com a AE, mas nem sequer tinha cargo. Não tinha, nem passou a desejar ter um. Só se «deixou convencer» porque «mais ninguém» avançou. Uma razão levou-a a candidatar-se. Se o NECF ficasse deserto, perderia o mandato como membro efectivo da Associação Portuguesa de Estudantes de Farmácia (APEF). Recuperar esse lugar implicaria passar novamente três anos como membro observador.
«Foi tudo em cima do joelho. Tínhamos que apresentar uma lista, pelo que, sem tempo, puxámos pessoas só porque sim», relata Jéssica, concorda Sofia. Depois de eleitas, ficaram reféns da precipitação e da irresponsabilidade alheia. «Há pessoas que nunca aparecem, outras – a maioria – são novas nisto». Qualquer iniciativa implica um esforço enorme, «como se fosse sempre a primeira vez».
Jéssica não se deixa abater. Apesar de improvisada tem qualidades de líder. «Não sabemos, fazemos por saber, estudamos. Isso não é o pior». Começaram cheias de garra. «Íamos ter um espaço, melhorar a nossa divulgação, trabalhar bem as redes sociais, organizar muitas iniciativas…». Suspiram as duas, em sintonia.
O tal novo espaço, organizado e condigno, continua à espera de resposta da AE. O actual é um amontoado de coisas avulsas: secretárias, blocos de gavetas, cartazes empilhados de iniciativas antigas, rolos de papel de cenário, o busto inesperado de uma boneca. «Desculpem, depois arrumamos as coisas para a fotografia», clama Sofia, enquanto afasta tralhas para nos sentarmos. Como se entendem neste caos? «Os nossos materiais estão espalhados pelas casas dos membros, porque não temos onde colocá-los».
Para além da falta de espaço, a escassez de tempo revelou-se outro obstáculo. Numa escola privada, tempo é dinheiro. Colocar em risco o sucesso escolar dá prejuízo. Sofia está no 3.º ano e paga seis mil euros de propinas. Jéssica anda perto disso. Como vem de fora, tem de contribuir para a renda de uma casa que divide com três amigas. Ambas vão almoçar a casa sempre que possível, para não terem mais um custo com a cantina.
Se deixarem uma disciplina para trás, os recursos custam 30 euros. «Estamos muito pressionadas para passar a tudo à primeira, o que não se coaduna propriamente com o cumprimento das exigências da representatividade». Por serem apenas um núcleo, não beneficiam do estatuto de dirigentes associativos. Não têm acesso à época especial de exames, nem ao desconto de 20 por cento sobre o valor das propinas. O Conselho de Praxe e a Tuna beneficiam disso, elas não.
«Queremos chegar a tudo e acabamos por não chegar a nada», comenta Sofia. A todo o momento são necessárias escolhas. «Não fui ao Churrasco Farmacêutico porque tinha teste no dia seguinte, mas em vez de estudar estive ao telefone a organizar as boleias dos colegas que foram».
Jéssica e Sofia não são pessimistas profissionais, têm entusiasmo. O curso só lhes merece elogios. Defendem a qualidade pedagógica, louvam as «excelentes condições laboratoriais» e encaram como um privilégio as cadeiras de Marketing, Dermocosmética, Serviços Farmacêuticos ou Competências Pessoais.
As nossas anfitriãs levam-nos às aulas de Farmacognosia e Fitoterapia, com a professora Ana Pintão, e Interacção Fármaco Receptor, da professora Tânia Fernandes. Conhecemos finalmente os outros membros do NECF. Estão a fazer o curso. «A maior parte do 2.º ano integrou a lista só para que as coisas continuassem», explica Raquel Inez, 19 anos, titular do Departamento de Formação e Ensino. A experiência está a ser «trabalhosa», porque «as pessoas não têm interesse».
Apesar da falta de participação, a estrutura do NECF tem a ambição de espelhar a da APEF. São 22 elementos, organizados em sete departamentos. Representam 178 alunos, a maioria a frequentar o 4.º e 5.º anos. «Com a crise, o número de novas matrículas caiu drasticamente», informa Sofia.
Falar de orçamento é entrar noutro labirinto. «Neste momento devemos ter mil euros, talvez nem tanto. E isto porque fizemos cabazes de Natal», revela Jéssica. Os apoios de instituições como a Ordem dos Farmacêuticos e a ANF dependem do relatório de actividades, mas o do ano passado ainda não foi entregue. «Temos um orçamento reduzido. Tentamos fazer festas, mas não dão lucro, porque somos poucos», revela Carolina Carvalho, tesoureira, de 21 anos. O plano de actividades de 2017 foi reduzido ao mínimo. Até agora, fizeram «uma pequena festa cultural». Tentam é não falhar em nada com a APEF. Têm planeado um simpósio para breve.
Apesar destas dificuldades todas, o presidente da AE do Instituto Superior de Ciências da Saúde afirma que este é um dos núcleos mais activos. Seja como for, Jéssica e Sofia só vão ficar até ao fim do mandato. As duas confessam-se desmotivadas. Nem os namoros resistiram ao sacrifício associativo.