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28 abril 2020
Texto de Irina Fernandes Texto de Irina Fernandes

«Obrigado pela ajuda que me dão»

​​​Asmático e a lutar contra a obesidade, José Pereira conta com ajuda da Farmácia Madalena que lhe leva os medicamentos a casa.
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T-shirt vestida, pés em sentido, José Pereira sobe à passadeira para «mais uma boa caminhada». É assim todos os dias. «Fazer exercício físico faz-me bem», conta.

Nem sempre foi assim. Aos 46 anos José Manuel Pereira luta há anos contra a obesidade. Em 2018, chegou aos 190 kg. «Era uma bomba-relógio». A médica fez-me o aviso. E disse-me que eu não poderia de forma alguma continuar a aumentar de peso».

De há dois anos para cá, tudo mudou. Hoje pesa 137 kg. «Como menos, e mais vezes ao dia. Como mais fruta, legumes, saladas. E só como pão integral», afiança o açoriano que, antes do agravamento do estado de saúde, trabalhava como pedreiro. 

Residente na freguesia de São Caetano, concelho da Madalena, na Ilha do Pico, Açores, José Pereira não trava apenas luta contra a obesidade. Soma vários problemas de saúde: é asmático desde nascença, diabético e hipertenso.

Por estes dias em que a ilha vive a um novo ritmo, cumprindo confinamento, José – sem carro próprio e doente de risco – esteve preocupado. Temeu que a medicação diária lhe faltasse. 

A redução da actividade do aeroporto e dos navios que fazem a ligação entre a Ilha do Pico e a Ilha do Faial adensou a ansiedade dos picoenses, mais dependentes da chegada de produtos vindos do continente.

Ao telefone, com os profissionais da Farmácia Madalena, encontrou o primeiro amparo.

«O Sr. José ligou-nos a solicitar a medicação. Encaminhou-nos as mensagens com as receitas electrónicas e disse-nos  a medicação que precisava», explica a farmacêutica Andrea Paulo, 34 anos.

Sem demoras, a profissional fez-se à estrada. «À ida para casa, uma vez que a casa do Sr. José fica a 15 km da farmácia e em caminho para minha casa, entreguei a medicação».

Confinado em casa desde o início de Março, José Pereira abriu a porta de casa com satisfação para receber a farmacêutica Andrea. «A doutora é uma pessoa muito disponível. Já aconteceu estar em semana de urgências lá na farmácia e vir cá a casa entregar medicamentos que me faltavam. Veio logo». 

De baixa médica, o doente crónico considera o serviço «excelente» pois, no seu caso, se não pudesse contar com as entregas ao domicílio nem sabe como seria: «Obrigado pela ajuda que me dão».

Esta não foi a primeira vez que a farmacêutica fez entregas ao domicílio para ajudar José.

«Já o tinha feito outras vezes antes da pandemia e de termos criado o serviço ao domicílio, uma vez que o Sr. José não tem transporte». 

Com o país a responder a uma crise sanitária publica, a Farmácia Madalena intensificou a ajuda levando a medicação a quem precisa. «Enviámos uma mensagem aos nossos utentes a informar a disponibilidade para levar os medicamentos ao domicílio. Há sempre pessoas que não têm ninguém por perto para as ajudar, ou que estão de quarentena e não podem sair de casa. Nessas situações, nós vamos a casa das pessoas», relata Andrea Paulo.



Responder às necessidades da comunidade dentro e fora do espaço de farmácia é uma prática que faz parte da história da Farmácia Madalena. De portas abertas desde 1957, a farmácia tem sido o apoio de dezenas de picoenses. 

«Temos de cuidar uns dos outros. Há pessoas que precisam muito de ajuda e estão sozinhas», afirma a directora-técnica e farmacêutica Jesuína Freitas, de 87 anos, há 63 ao leme da farmácia. 


​Por causa de uma queda pouco antes do estado de emergência ser declarado, Jesuína Freitas encontra-se em casa em recuperação.  Jesuína Freitas é a farmacêutica mais antiga do Arquipélago dos Açores. 

Agora, anseia pelo dia em que possa voltar à farmácia. Quando se encontrava bem de saúde, todos os dias apanhava a lancha no Faial e saía no porto da Madalena, para mais um dia de trabalho. As saudades, essas, mata-as agora pelo telefone. «Ligo para lá todos os dias. Gosto de saber o que se passa».

Tem esperança de que os casos de infecção por COVID-19 não aumentem na ilha. «No Pico, isto do vírus está mais ou menos controlado. Só tivemos cinco casos». 

O arquipélago dos Açores registava 121 casos de infectados, a 28 de Abril de acordo com o Boletim da DGS.

Por forma a proteger funcionários e clientes, a dinâmica de atendimento foi repensada.  

«Estamos a trabalhar com placas de acrílico ao balcão e em turnos de duas equipas. Uma das 09h às 14h e outra das 14h às 19h. E apenas é permitida a entrada de dois utentes de cada vez», explica a farmacêutica, Andrea Paulo. 

Por ser a única farmacêutica em funções, Andrea Paulo tem tido cuidado redobrado. «Se o barco afundar, só estou eu cá para atender», solta.

Doente de risco e polimedicado, José Pereira admite ter muito medo do vírus. «Quando me constipo acabo por ter crises de asma. E, é quase certo, que com isso tenho de ir fazer vapores ou medicação ao hospital ou ao Centro de Saúde», conta o utente que é acompanhado pelo médico de família e de três em três meses no Hospital da Horta no Faial, onde tem consultas de nutrição.

Financeiramente dependente da pensão de reforma da mãe e de um subsídio pela morte do pai, há cinco anos, José vive com a mãe, de 71 anos e igualmente diabética. 

«Neste momento, o meu maior desejo é que a minha saúde não piore pois as minhas doenças estão estáveis. E gostava que a Segurança Social resolvesse a minha situação e passasse a declaração de invalidez por doença. Os médicos declararam em relatório os riscos que corro… Infelizmente, não posso exercer a minha actividade», desabafa.  

A aguardar nova consulta no Hospital da Horta, agendada para 1 de Julho, José Pereira sairá então pela primeira vez à rua desde que o país e o mundo enfrentam a pandemia de COVID-19. 

A farmacêutica Andrea Paulo já o serenou. «Sei que tenho de usar máscara, mas ainda não tenho nenhuma. A doutora sabe que tenho estes problemas todos de saúde. Já me garantiu que não me faltarão máscaras nem medicamentos».
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