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21 dezembro 2021
Texto de Carina Machado Texto de Carina Machado Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro Vídeo de André Torrinha Vídeo de André Torrinha

«O mais bonito no desporto é evoluir juntos»

​​​O canoísta olímpico Fernando Pimenta explica como treina o corpo e a mente para as vitória.

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Dizem que era desajeitado e descoordenado.

[Risos] Já lá vai o tempo, mas é verdade. E ainda tenho um bocadinho desses traços de quando comecei na canoagem, em 2001, numas férias de Verão em Ponte de Lima. Foram dois meses aos tombos no rio Lima com um grupo de amigos, que ainda se mantém. O espírito de entreajuda, a forma como nos motivávamos uns aos outros para que nenhum desmoralizasse quando caía à água e subia novamente para o caiaque, foi o que me fez gostar da modalidade.

Como é que chega a ser um dos atletas mais medalhados do país?
Com muito trabalho, muita disciplina e, literalmente, caindo à água e levantando, caindo e levantando, caindo e levantando... É o processo de todos os campeões, no fundo.

É uma pessoa determinada?
Sim, tenho o meu foco, os meus objectivos. Acho que a determinação é importante para cumprirmos as nossas ambições.

Faz ideia de quantas medalhas já ganhou?
Sei que tenho 108 medalhas internacionais, mas não faço ideia das nacionais. Tenho 55 ou 56 títulos de campeão nacional, mas de resto não sei. 



Sabe as que lhe faltam? O ouro olímpico…
Sim, e o ouro em Jogos Europeus. Tenho quatro medalhas de prata e espero alcançar o ouro antes de terminar a carreira. Sei que mais cedo ou mais tarde os resultados vão deixar de aparecer, porque, infelizmente, nós, atletas, estamos fisicamente limitados pela idade, por isso seria um final em beleza.

Que idade tem?
Tenho 32 anos. Em média, na canoagem, um atleta de alto rendimento pode estar em competição até aos 40. Mas para já não quero pensar nisso. Estou concentrado nos Jogos Olímpicos de Paris em 2024, perspectivo Los Angeles em 2028 e Austrália em 2032. São objectivos! Como é óbvio, tudo depende do percurso em termos físicos e emocionais. Quando deixamos de estar felizes com o que fazemos, é importante aceitar e procurar algo diferente. Mas neste momento sinto-me feliz, sinto-me bem, acho que posso continuar a contribuir com excelentes resultados para Portugal e orgulhar os portugueses, que é a parte bonita de tudo.

Quando decidiu fazer do desporto uma carreira?
Não houve um momento específico, foi uma evolução natural. Há alguns marcos, como a minha primeira prova internacional, no Festival da Juventude em 2005, em Itália, em que conseguimos uma medalha de ouro em K4 [caiaque de quatro lugares] 500 metros. Os resultados continuaram a aparecer, mesmo quando “saltei” para o escalão sénior e, aos poucos, fui-me apercebendo de que tinha alguma apetência para isto. Senti maior responsabilidade a partir do momento em que integrei o projecto olímpico.

Pretende retomar o curso universitário?
Para já, tenho de estar mais focado na carreira desportiva. Sabe? Fazia os primeiros semestres e os segundos ficavam pendurados, porque começavam as competições internacionais e entrava em estágio. Agora nem isso conseguiria fazer. A partir do momento em que eu e o meu treinador decidimos que tínhamos de começar a focar-nos mais e mais cedo, tornou-se impossível. Passamos muito tempo fora, com dois a quatro treinos por dia, durante 11 meses do ano, sem paragens. Mas voltar ao curso de Reabilitação Psicomotora é um dos meus planos.

O treinador importa na construção de um campeão?
Sim, muito. Tem de ser um bom líder, para retirar do atleta o melhor rendimento, e tem de ser um Fernando Pimenta prepara as competições com quatro treinos diários estratega todo o tempo. O meu treinador, que é também um excelente gestor, tem desenhado bem o caminho e eu tenho conseguido acompanhar e fazer o que ele me pede.



Hélio Lucas é o seu treinador desde sempre…
Sim, foi ele quem me convidou para ficar na equipa de competição, no final do Verão de 2001. Formamos uma boa equipa, estamos sempre abertos a acolher outros atletas e estrutura técnica. De vez em quando vêm equipas estrangeiras trabalhar connosco. Antes dos Jogos Olímpicos, por exemplo, as selecções de Espanha e da Argentina estiveram cá.

 



Treinaram com os vossos adversários directos?
Sim, é o espírito da nossa modalidade! E uma das partes mais bonitas do desporto, esta possibilidade de interagirmos, de aprendermos, de evoluirmos juntos.

Já participou em provas por equipas, mas ultimamente compete individualmente. Prefere o K1 [caiaque de um lugar]?
São coisas diferentes e a preferência, a maior apetência deve-se ao momento que atravessamos. Numa equipa, os atletas não têm o mesmo Fernando Pimenta compete sozinho actualmente. «Estou num momento de superação pessoal, de me pôr à prova» perfil, forma de pensar e de estar dentro do grupo. Isso representa um desafio extra de coordenação de diferentes personalidades, que me dá imenso prazer. Contudo, estou num momento de superação pessoal, de me pôr à prova. Sei que os resultados nos próximos tempos vão depender só de mim, do meu esforço e do meu trabalho.



Que cuidados tem no dia-a-dia?
Presto muita atenção à recuperação e ao descanso, sigo uma alimentação o mais variada possível, levo a sério a necessidade de manter uma boa hidratação. No fundo, os cuidados que todos deveríamos ter. 

Há pouco falava da importância dos estados emocionais. Também “treina” a sua saúde mental?
Agradeço a questão, porque é um tema que até há muito pouco tempo era tabu. Já tínhamos um psicólogo na Federação que nos dava apoio. No último ano comecei a ser acompanhado mais de perto e é uma área que quero continuar a trabalhar, porque é muito importante. Toda a sociedade passa hoje por uma pressão enorme, a pandemia tornou tudo mais duro. Os atletas de alta competição vivem a tensão extra de só terem aquele momento para cumprir a missão para a qual trabalharam durante meses ou anos. Se o momento falhar ou eles falharem no momento, não dá para compensar no dia seguinte. Além disso, o meu trabalho é muito solitário. Já tentámos ter parceiros de treino portugueses a tempo inteiro, mas não nos foi dada essa possibilidade. Eu e o Hélio acabamos por viajar sempre os dois, treinamos sempre os dois, vivemos em estágio praticamente os dois. Há dias em que acusamos cansaço e é preciso encontrar uma estratégia para gerir o melhor possível. Há quem diga, quando somos seguidos por um psicólogo: “Está maluco, não está bem”. Pois eu acho que é mesmo para não ficarmos mal e para sabermos como reagir.



O que é mais arrepiante: ouvir o hino nacional ou ser homenageado pelo Presidente da República?
Ouvir o hino! Só o ouvimos quando ganhamos. Se ficarmos em segundo lugar, ouvimos o hino do atleta que ficou em primeiro. É claro que é muito bom sermos recebidos em grandes ordens honoríficas, mas só acontece porque ouvimos o hino! [risos] É importante para mim, mas também para a modalidade e para os mais novos, ver o reconhecimento do nosso trabalho.
 
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