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9 outubro 2020
Texto de Irina Fernandes Texto de Irina Fernandes

Doses de esperança

​​​​​Um xarope feito na farmácia protegeu um recém-nascido contra enfartes.

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Farmácia Ribeiro - Vendas Novas, Évora

Hospital Universitário de Oslo, Noruega. Há frenesim na sala de partos. O choro de Christian faz-se ouvir pela primeira vez. Tem 51 cm e 3.810 kg. O momento de alegria escapa-se. Algo não está bem. Abrem-se as portas do bloco operatório. 


Christian sobreviveu graças a um medicamento preparado na farmácia

«A válvula do coração que transporta o oxigénio estava tapada. Teve de ser operado logo na primeira hora de vida», conta Camilla Hóyer, de 35 anos, recordando o dia 12 de Dezembro de 2018. 

Christian Phillip Hóyer Dias tem agora um ano e nove meses. Já foi submetido a três cirurgias ao coração. Desde a primeira semana de vida sobrevive com um xarope de cloridrato de propranolol, medicamento beta-bloqueante, que promove a regularização da frequência cardíaca, protegendo-o de enfartes e outras crises. 

A indústria farmacêutica não tem resposta para casos como o dele. O medicamento só está disponível no mercado em comprimidos, com uma dosagem mínima de 10 mg, tóxica até as crianças atingirem os dez quilos. A mãe ficou apreensiva e temeu o pior. «Como é que iríamos conseguir dar um comprimido a um bebé tão pequeno? Como iria engoli-lo?», perguntava-se. 

A viver há três anos em Vendas Novas, distrito de Évora, encontrou a solução na Farmácia Ribeiro: propranolol em xarope, na dose adequada a recém-nascidos. «Comecei a fazer esta solução oral quando ele ainda não tinha um mês de vida. À medida que foi crescendo e ganhando peso, fui aumentando as concentrações», relata a farmacêutica Sílvia Morais. «A doutora Sílvia adicionou ao xarope aroma de morango, para ele gostar e tomar facilmente», conta a mãe, de coração reconhecido. 

Quando Christian atingiu os dez quilos, passou a tomar o comprimido de fabrico industrial. «Misturo-o no iogurte, no leite e na comida. Mas é mais difícil. Tínhamos mais confiança quando lhe estávamos a dar o manipulado, porque sabíamos que o medicamento tinha sido consumido», assume Camilla. O filho vai mesmo voltar a tomar o xarope, antes de ser submetido a uma quarta cirurgia. Os pais querem ter a certeza de que «a quantidade certa está no corpo do nosso bebé». 


A pesagem rigorosa dos componentes é fundamental para a qualidade e eficácia da pomada preparada na Farmácia Ribeiro

A Farmácia Ribeiro apostou na produção de medicamentos manipulados assim que abriu as portas, em 1979. «No meu tempo, era quase tudo manipulados. Eu fazia hóstias, papéis, cápsulas, xaropes. Só depois entrou a caixinha de comprimidos, esporadicamente», recorda José António Ribeiro, o farmacêutico proprietário, que tem 45 anos de prática profissional. 

Hoje, recebe centenas de receitas de terapêutica personalizada para doentes de todas as idades. Pediatras, dermatologistas e alguns otorrinolaringologistas lideram os pedidos. Manipula diversas suspensões orais e outras formas farmacêuticas. Não há em Vendas Novas e arredores quem não conheça, elogie e recomende a pomada para o rabinho dos bebés produzida pela Farmácia Ribeiro há mais de 30 anos. De textura espessa e feita à base de lanolina – gordura retirada da lã do carneiro – é uma referência para tratar a dermatite da fralda. «A lanolina é um dos melhores hidratantes. Além de hidratar e preservar a pele à superfície, consegue evitar a saída excessiva da água da pele», especifica Sílvia Morais. Por ano, a farmácia produz no seu laboratório uma média de 200 unidades. 


O médico Carlos Reis inventou o remédio das assaduras em parceria com o farmacêutico José António Ribeiro. A cumplicidade continua com a directora-técnica da nova geração, Andreia Ribeiro


A pomada nasceu da cumplicidade criativa entre o farmacêutico José António Ribeiro e o especialista em Medicina Geral e Familiar Carlos Reis. «Naquela altura, o arsenal terapêutico era relativamente pobre. Utilizava-se corticóides tópicos por tudo e por nada nas crianças. Eu disse para o doutor José António: “Tenho aí umas ideias”», recorda o médico, de 71 anos, que exerceu no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, e no Centro de Saúde de Vendas Novas, antes de se reformar. 

A eficácia da fórmula criada pelos dois amigos não se perdeu no tempo. «Quando o meu filho mais velho entrou para o berçário, as assaduras eram uma constante. Só passaram quando experimentei a pomada», conta Cátia Oliveira. A experiência adquirida com Tomás, de quatro anos, beneficia agora o irmão Gabriel, que tem seis meses. A técnica de análises clínicas, de 32 anos, garante que o filho mais novo não tem problemas porque usa a pomada em casa e na creche. «Usamos todos os dias e até temos em stock! 

Aconselhamos aos pais e eles acabam por gostar», conta Mara Simões, educadora de infância, que cuida de crianças dos quatro meses aos seis anos na Associação 25 de Abril, de Vendas Novas. 

«É o voltar às nossas origens, à “farmácia botica”. Os manipulados estão a emergir e ainda bem, porque dão respostas seguras», considera a directora-técnica, Andreia Ribeiro. A produção respeita escrupulosamente as receitas médicas e as instruções do Laboratório de Estudos Farmacêuticos (LEF) da Associação Nacional das Farmácias. Os consultores do LEF esclarecem quaisquer dúvidas sobre manipulação, a todo o momento. «Aqui não se pode falhar», vinca o farmacêutico proprietário. 

Para Christian e Camilla Hóyer a luta pela vida continua: «Este manipulado trouxe-nos esperança».

 


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