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4 outubro 2019
Texto de Carina Machado Texto de Carina Machado Fotografia de Mário Pereira Fotografia de Mário Pereira Vídeo de Emanuel Graça Vídeo de Emanuel Graça

Cavalos, touros e toureiros

​​​​​​​Viagem ao mundo da festa brava vila-franquense.

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A festa brava é um dos cartões de visita de Vila Franca de Xira, terra que, nas palavras de Vítor Pantaleão, «não é melhor nem pior» do que outras. «É diferente, porque consegue conciliar as três tauromaquias: a lide a cavalo, a lide apeada e os forcados». 

Há 40 anos que a Praça de Touros Palha Blanco, epicentro concelhio da tauromaquia, é a sua segunda casa. Entrou em 1977 para se inteirar da manutenção eléctrica e hoje assume a direcção, através do pelouro que lhe foi atribuído pela proprietária, a Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca de Xira. 


A praça de touros Palha Blanco data de 1901 e é um dos ícones do concelho de Vila Franca de Xira

O nome da praça, explica o responsável, deve-se ao principal fundador, um reputado lavrador e criador de gado bravo local, que promoveu a construção do edifício depois de o anterior, em madeira, ter sido totalmente consumido num incêndio. A inauguração, em 30 de Setembro de 1901, contou com a presença dos monarcas D. Carlos e D. Amélia, e restante família real, transportada de comboio e recebida, entre os milhares de presentes, fanfarras e monteiros, pelo próprio Palha Blanco. Do alto do seu cavalo, encabeçava um grupo de 150 campinos, montados e fardados a rigor. Nessa tarde, foram lidados na nova arena 12 touros. 

Numa outra tarde, a 8 de Maio de 1944, a Palha Blanco serviria um fim diferente: foram ali aprisionados os operários grevistas das fábricas da vila de Alhandra, desviados da marcha de protesto que faziam contra as condições de trabalho na estrada nacional.

Hoje em dia, as portas da centenária praça de touros continuam a abrir-se sempre que são realizadas corridas ou em eventos promovidos pela Câmara Municipal. «No Colete Encarnado, no primeiro fim-de-semana de Julho, e na Feira de Outubro, também no primeiro fim-de-semana do mês, a praça participa das largadas e esperas de touros. São eventos que têm sempre uma afluência tremenda do público e que deixam as bancadas repletas», congratula-se Vítor Pantaleão.


Víctor Pantaleão, director da praça Palha Blanco 

A arena da Palha Blanco não é lugar estranho ao Grupo de Forcados Amadores de Vila Franca de Xira. Fundado em 1932, o grupo conta hoje com 35 elementos, sendo que a cada pega em praça comparecem oito: o forcado da cara e sete ajudas, um deles o rabejador.

Vasco Pereira é o forcado cabo do grupo. É ele quem atribui os papéis dentro do campo em face das características do touro. A forcadagem, arte genuinamente portuguesa, carece de «gosto pela festa, uma dose de coragem e vontade de superação». Mas, acima de tudo, acrescenta Vasco, é preciso existir espírito de amizade e união entre o grupo. «Sem isso, as coisas não correm bem dentro de praça». 


Vasco Pereira, cabo do Grupo de Forcados Amadores de Vila Franca de Xira

Tem 21 anos, todos passados por dentro da cultura. «O meu pai foi forcado, era a minha tia quem fazia as fardas do grupo… Desde que me lembro de mim que me lembro do grupo».  

O colectivo é igualmente jovem. Os mais novos têm 16 anos e o mais velho 41. «É o nosso rabejador, um dos melhores em Portugal e que, na próxima época, irá completar 20 no activo, o que é muito pouco comum». A longevidade em praça, assinala Vasco, é uma particularidade dos forcados em Vila Franca de Xira, «talvez por serem melhor geridos e não sofrerem tanto desgaste. São raros os forcados com mais de 100 pegas de cara e só na geração que se despediu agora, com o cabo antes de mim, tínhamos três».

Os troféus a atestar a valentia e destreza cobrem as paredes da Casa dos Forcados, que se vai tornando curta para tanto espólio. O lugar, que serve de sede ao grupo, abre portas nas festas da terra e assume perfis de uma tertúlia que se estende pelas ruas contíguas. «Temos muitos amigos de outros grupos, muita gente da festa que nos visita. Mas há sempre lugar para mais um». Fica o desafio para uma próxima ocasião.


O colectivo de forcados amadores está activo há 87 anos.

Não muito longe, na Travessa do Alecrim, fica a Casa Museu Mário Coelho. Foi aqui que nasceu, há 83 anos, o “maestro”, título que lhe é atribuído no mundo da tauromaquia pelo primor alcançado na arte do toureio a pé. «Apesar do privilégio que tive nesta vida, de poder frequentar os locais mais interessantes e mais luxuosos do mundo, foi aqui, nesta casa modesta, que fui mais feliz».


A Casa Museu Mário Coelho está instalada na casa de infância do toureiro

O visitante encontra expostas as peças mais importantes do universo taurino, troféus das feiras mais relevantes de Espanha, França, América Central e do Sul, ofertas de presidentes e monarcas, trajes e peças usadas em praça. Com sorte, encontra Mário Coelho. «Em pequeno, quando estava sozinho em casa, toureava com uma toalha e, com a minha timidez, muitas vezes pensava que as paredes se riam de mim. Estas mesmas paredes, onde agora tenho o contentamento de ver colocadas todas estas peças». 


Os muitos troféus expostos atestam a maestria de Mário Coelho nas lides taurinas

A Travessa do Alecrim era, em tempos, conhecida como a travessa dos maiorais, dos campinos. O pai era um deles. «Nestes 30 metros, vivíamos num autêntico ambiente de campero, onde se cheirava a cavalo, a lama e até ao toiro. A conversa em casa era constantemente sobre o campo. Mas não era só cá em casa, era o ambiente que se vivia em Vila Franca. Isto aqui era um microclima». 

Sem outras coisas que as ocupassem, as crianças na época contavam os dias e as horas para a chegada das festas da terra. «Nesses dias havia pequenos toiros na rua, as bandas a tocar, muitos forasteiros… Aí sim, vivíamos uma vida fantástica, de ambiente taurino e contentamento»

A vontade do toureio, «o veneno» como diz, nasceu com ele e, aos 11 anos, depois de muitas faenas em casa, fugiu às paredes e numa pequena praça de campo, na Companhia das Lezírias, pôs-se diante de uma novilha. «Saltei para os curros, onde as novilhas pass​avam quando eram ferradas. E aproveitando a sua viagem, tentei: dei dois ou três capotazos. E foi, de facto, algo sensacional. A sensação daquela bezerra a investir junto, roçando-se na minha barriga, quatro, cinco ou seis vezes, foi algo sensacional, que não se pode transmitir».

Toureou até aos 55 anos em praça. Foi dos toureiros mais veteranos a retirarem-se. Completou 1.473 corridas, toureando 3 mil toiros por todo o mundo taurino, «além dos que também seleccionei para pais reprodutores». Continuou as suas faenas de campo até completar 80 anos. «Era o chamado toureiro campero e na minha vida andei por 15 mil vacas bravas toureadas no campo, de 158 ganadarias. Tenho memorizada a imagem, o nome e o comportamento de muitas e, digo-lhe, nunca encontrei dois animais iguais». 


Mário Coelho, o toureiro português a quem chamam de “Maestro”

O toureio ficou para trás, mas os touros fazem parte de si. «Os toiros estão sempre no meu pensamento. Sempre. Entreguei-me a eles e eles deram-me tudo: uma vida, mundo, glória e até dinheiro. Nunca tive medo, só respeito, porque pensei sempre que o meu sangue seria um preço baixo a pagar pelo muito que estes animais fantásticos me deram». 


O turismo equestre é a marca do Morgado Lusitano

No Morgado Lusitano os cavalos são reis. Instalado na Quinta da Portela, herdade do século XVIII, em Alverca, aposta no turismo equestre, conjugando a oferta hoteleira com a escola de treino clássico de cavalos lusitanos. «Falamos, grosso modo, do ballet dos cavalos, ou seja, de um treino assente em exercícios clássicos de pormenor no movimento, tal como ele é feito desde o tempo de D. João V», explica Henrique Santos, director comercial do Morgado Lusitano.


Henrique Santos junto aos estábulos da herdade que acolhe cerca de 50 cavalos lusitanos

A propriedade é a casa de cerca de 50 cavalos, todos de raça lusitana, com diferentes idades e níveis de treino. «Alguns são nossos, outros são de clientes que os trazem para serem cá ensinados e os deixam ficar aqui instalados, voltando amiúde para os montar». A oferta completa-se com uma escola de equitação, a funcionar num picadeiro diferente, frequentada por pessoas desde os seis anos de idade, e a organização de eventos, cujo espectáculo equestre é o principal factor diferenciador. ​

 

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