Muito por influência da família e dos valores transmitidos, Carolina começou o percurso como voluntária numa creche social em Viseu, aos 15 anos. Nunca mais parou. Nem mesmo quando se viu numa cidade nova, o Porto, aos 17 anos (corria 2007) para estudar Engenharia Biomédica. Entre queimas e noitadas, livros e papeladas, Carolina sentia que não lhe sobrava tempo para mais nada. Os dias eram noites, as noites eram dias e os fins de semanas… esses dividiam-se entre estudo, regresso a casa e à família, viagens que não trocava por nada. Além da comida da mãe e dos serões no sofá em frente à lareira a ver filmes com o pai e a irmã, era em Viseu que revia os amigos. Domingo era o dia da saudade! Saudade no adeus através do vidro do autocarro que se agravava ao atravessar a cidade de regresso ao Porto. É que no percurso passava pelos diferentes lugares onde fez voluntariado e lembrava-se dos momentos que passou. Todos, sem exceção, traziam-lhe memórias felizes e, curiosamente, em todos o tempo não era um problema. Existia tempo e este parecia nunca acabar…
Num dos dias normais de correria na faculdade, Carolina ia a entrar no auditório quando reparou num cartaz onde se lia VO.U – Voluntariado Universitário. Tantos anos depois, Carolina não se lembra de nada do que o professor falou na aula. A única coisa que reteve foi a determinação em regressar ao voluntariado.
No Porto participou em diferentes iniciativas, desde apoiar o estudo acompanhado de crianças num bairro social, ajudar uma mãe idosa a levar o filho com deficiência motora profunda a passear no parque da cidade do Porto, até dar aulas de dança de salão com as colegas de casa a pessoas em processo de reinserção na sociedade. Quando regressava a Viseu, nas férias de verão, ajudava crianças com transtornos do especto do autismo nas aulas de natação.
Concluído o mestrado, Carolina conseguiu o primeiro emprego e mudou-se para Lisboa em 2013. «Lisboa é uma cidade cheia de oportunidades, fazer voluntariado é tão simples… por exemplo ceder o lugar a uma senhora idosa no Metro ou comprar uma garrafa de água e deixar ao lado do senhor que dorme duas ruas abaixo numa caixa de cartão»! A sua paixão pelo trabalho foi roubando tempo, mas havia sempre um dia em que recordava o que já tinha feito e que dividir o tempo com alguém era a forma mais simples e pura de o multiplicar.
Coordenadora do projeto de responsabilidade social de uma das empresas onde participou, foi voluntária na Casa das Cores e pertenceu à Comunidade Vida e Paz, onde durante vários anos saiu à quarta-feira à noite para entregar sorrisos e algo para comer. Foi numa dessas quarta-feiras que conheceu o senhor José, uma pessoa em situação de sem-abrigo que amava ler. Juntos partilhavam histórias, Carolina levava livros e José prometia que na próxima visita lhe contava o resumo. Fossem que horas fossem, Carolina encontrava sempre tempo para ouvir José. Porque tinha de trabalhar no dia 26 de dezembro, houve um ano em que teve de deixar as festas e regressar a Lisboa a 25. Não podendo evitar este facto pensou, e partilhou com os pais, a possibilidade de terminar o dia 25 de uma forma feliz. Juntaram um pedaço de cada doce de Natal, o pai deu um casaco, a irmã um livro policial. E assim foi: fez a viagem em direção a Lisboa mas não em direção a casa… ia em direção a Santa Apolónia, onde se encontrava sempre com o José.
Nesse dia, infelizmente, o José não estava. Apenas o seu cobertor e o amigo do “quarto”, que a informou que o José tinha sido internado de urgência com uma pneumonia.
Sem conseguir dizer nada, Carolina ape- nas desejou um bom Natal, deixou os doces e regressou a casa. Lembra-se de ter chorado e que nessa noite dormiu muito pouco. No dia seguinte, foi trabalhar e, de cada vez que olhava para o relógio, desejava que já fosse a hora de saída. Às 18h em ponto saiu porta fora: tinha uma missão por acabar.
Entrou no último horário das visitas. E quando ambos se olharam foi um misto de risa- das com choro. Carolina entregou o presente de Natal e perderam-se entre conversas. Antes de ela se vir embora, José disse-lhe que ela tinha sido a sua única visita, mas que a sua vinda tinha sido o melhor presente… abraçaram-se, num abraço sem tempo que criou uma nova bonita memória de Natal.
Como estamos na época de Natal fica o registo de uma das muitas histórias em que Carolina foi atrás do Natal.
Ser voluntário não é para todos: exige compromisso, assiduidade, conseguir levar alegria, esperança, conforto emocional. Mas é também perceber quando se tem de sair. «Quando percebemos que já não acrescentamos, nem conseguimos cumprir o que nos é pedido», revela a jovem, acrescentando que «há sempre novos projetos».
Carolina garante que, para si, ser voluntária é uma forma de estar na vida. E podemos ser todos os dias: com um sorriso a quem está triste, um abraço a um colega ou conhecido fragilizado, dar o lugar no autocarro ou no Metro.
Neste Natal ofereça de si todos os dias, ligue o radar de atenção ao outro.
AINDA PODE AJUDAR
A Casa das Cores
Just a change
Anjinhos de Natal