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9 outubro 2020
Texto de Carlos Enes Texto de Carlos Enes Fotografia de Miguel Ribeiro Fernandes Fotografia de Miguel Ribeiro Fernandes

Dois vírus, uma rede

​​​​​​​​​​Farmácias preparadas para segunda vaga da COVID-19 em plena época gripal.

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Até ao final de Setembro, a COVID-19 deverá ultrapassar um milhão de vítimas mortais em todo o mundo. A Europa prepara-se para enfrentar uma segunda vaga da pandemia em plena época da gripe sazonal. A combinação das duas doenças terá um impacto difícil de estimar sobre os serviços de saúde. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, todos os anos morrem, em média, mais de 650 mil pessoas devido à gripe, 72 mil das quais na Europa. 

E em Portugal? A COVID-19, que mudou o nosso estilo de vida, está agora a chegar às duas mil mortes. É infelizmente provável que a mortalidade do novo coronavírus possa atingir – e até ultrapassar – as piores épocas gripais. No Inverno de 2018/19, o Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge contabilizou 3.331 óbitos devido à gripe. Este número seria ainda pior se fossem contabilizadas todas as pneumonias e infecções respiratórias que se aproveitam do vírus influenza para matar, em especial os mais vulneráveis: idosos e doentes crónicos. 

Se as coisas correrem mal, a coabitação na comunidade do novo coronavírus com o influenza fará disparar tragicamente a mortalidade em Portugal, não só em vítimas directas como colaterais. Uma pandemia provoca mortes evitáveis, de pessoas com outras doenças, se os serviços de saúde reduzirem significativamente as consultas, exames de diagnóstico, cirurgias e outros tratamentos. O Instituto Nacional de Estatística (INE) já veio a público alertar para um aumento da mortalidade na casa dos 11 por cento. Entre 1 de Março e 30 de Agosto, morreram mais 5.882 portugueses do que em igual período do ano passado. Pelo menos dois em cada três destes óbitos não podem ser explicados pela COVID-19. 

Para evitar a catástrofe, o que pode a rede de farmácias oferecer ao Serviço Nacional de Saúde (SNS)? A maioria das respostas foi implementada em Março e Abril, com excelentes resultados: as farmácias «superaram as expectativas» de 70 por cento dos portugueses, de acordo com o centro de sondagens Spirituc. 

Em Março, criaram o serviço de assistência farmacêutica 1400. Com uma chamada telefónica gratuita, os cidadãos podem agora encomendar medicamentos 24 horas por dia. A rede de farmácias foi a primeira cadeia de serviços a garantir entregas ao domicílio em todo o território, permitindo aos idosos e doentes crónicos ficar em casa no pico do contágio. Os farmacêuticos comunitários garantiram a dispensa de medicamentos hospitalares, libertando os doentes mais frágeis da obrigação de fazerem deslocações desnecessárias aos hospitais. Naquele mês mais crítico, reforçaram em 7,8 milhões de euros a dispensa de medicamentos a crédito, evitando a interrupção de tratamentos dos cidadãos com maior fragilidade económica e dificuldade de acesso a consultas médicas.

Agora, na segunda vaga, as farmácias preparam-se para usar uma arma decisiva contra a letalidade de ambos os vírus: a vacina da gripe. Sim, dos dois. A vacina da gripe não protege da infecção por SARS-CoV-2, mas tudo indica que reduz a morbimortalidade da COVID-19. Um estudo realizado no Brasil, envolvendo 92.664 doentes infectados com COVID-19, por investigadores do Instituto de Saúde Pública da Universidade de Basel, Suíça, e do Departamento de Pediatria do Hospital Universitário de São Paulo, trouxe essa boa notícia. Os doentes que se vacinaram contra a gripe sofreram menos 8% de internamentos em cuidados intensivos, menos 18% de suporte invasivo respiratório e menos 17% de mortes do que os doentes não vacinados. 

Portugal vai receber 2,5 milhões de vacinas da gripe. O Ministério da Saúde fez a maior encomenda de sempre: dois milhões de doses. Em 18 de Setembro, data de fecho desta edição, não se sabe se as idades e outros critérios de inclusão nos grupos de risco, com acesso a vacina gratuita, vão ser alargados, como aconteceu noutros países​. A directora-geral da Saúde, Graça Freitas, anunciou que um primeiro lote, de 300 mil vacinas, seria administrado «prioritariamente a utentes e funcionários de lares, e aos profissionais de saúde».


O sistema informático das farmácias já faz o registo das vacinas, em comunicação com o SNS

A rede de farmácias vacina a população contra a gripe há doze anos. O respectivo sistema informático já está integrado com o do SNS, o que permite fazer o registo da administração da vacina a cada utente e evitar duplicações. No entanto, os doentes ainda não têm plena liberdade de escolha. As vacinas só são gratuitas nos centros de saúde, ao contrário do que acontece nos países em que o serviço farmacêutico é contratado pelo Estado. A Câmara Municipal de Lisboa recomendou ao Governo o mesmo investimento em Portugal, através de um moção apresentada pelo CDS, votada favoravelmente pelo PS e PSD no dia 17 de Setembro. 


A Câmara Municipal de Lisboa recomenda ao Governo o investimento no serviço farmacêutico de vacinação contra a gripe

Há dois anos, no concelho de Loures, foi iniciado o primeiro projecto-piloto em Portugal de vacinação SNS nas farmácias, muito bem recebido pela população e pelos médicos locais dos cuidados primários. No Inverno passado, mais de 9.500 pessoas com mais de 65 anos foram vacinadas gratuitamente numa farmácia da sua preferência. A imunização deste grupo de risco naquele concelho cresceu mais de 30 por cento. Os farmacêuticos comunitários administraram a vacina gratuitamente, por se tratar de um projecto-piloto. Apesar do resultado alcançado, o Estado ainda não tomou quaisquer decisões sobre a generalização do serviço a todo o país. A Associação Nacional das Farmácias (ANF) já manifestou ao Ministério da Saúde disponibilidade para ajudar o SNS a vacinar dois milhões de pessoas. 


Os CTT fizeram um protocolo com a ANF para garantir a todos os carteiros vacinas comparticipadas pela empresa numa farmácia à sua escolha

As farmácias adquiriram elas próprias 500 mil doses e têm feito protocolos para administrar vacinas aos trabalhadores de alguns sectores estratégicos, como os carteiros dos CTT e os colaboradores das cadeias de supermercados do grupo Jerónimo Martins.


FICHA TÉCNICA: Inquérito Spirituc à população residente em território nacional com idade igual ou superior a 18 anos. Foram aplicados 1.009 inquéritos online através de sistema CAWI (Computer Assisted Web Interview) sendo a amostra estratificada por género, idade e região de residência, tendo por referência os dados INE. À amostra global (N=1.009) corresponde uma margem de erro de ± 3,09% para um intervalo de confiança de 95%. O trabalho de campo decorreu entre os dias 20 e 26 de Maio de 2020.

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