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4 setembro 2025
Texto de Marta José Santos | WL Partners Texto de Marta José Santos | WL Partners Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro Vídeo de Duarte Almeida Vídeo de Duarte Almeida

“A literacia é fundamental para a saúde das populações”

​​​​​​​Portugal percorreu um caminho notável desde a criação do Serviço Nacional de Saúde, mas, para Maria de Belém Roseira, os maiores desafios continuam fora dos hospitais.

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Desde a Revolução dos Cravos, Portugal tem vivido uma transformação profunda, não apenas social e económica, mas também na saúde pública. A ex-ministra da saúde, Maria de Belém Roseira, partilha a sua visão clara e experiente sobre o percurso do país nesta área.

«Não há dúvida de que hoje estamos incomparavelmente melhor do que antes da criação do Serviço Nacional de Saúde», afirma, destacando tanto os avanços significativos como os desafios que ainda persistem.

Até há poucas décadas, Portugal era um país marcado por um atraso considerável em indicadores fundamentais para a saúde. «Tínhamos uma população extraordinariamente analfabeta, uma pobreza generalizada e graves insuficiências nas infraestruturas básicas, como as redes de águas residuais, o acesso à água potável e as instalações sanitárias», recorda. Esta realidade, consequência direta da exclusão social, refletia-se em indicadores de saúde muito precários.

Mas, apesar do progresso assinalável, Maria de Belém alerta para os muitos obstáculos que ainda persistem. «Se me pergunta se está tudo resolvido, longe disso, longe disso». As causas que afetam a saúde vão muito além dos cuidados clínicos, envolvendo determinantes sociais como a literacia, a pobreza e as condições de vida. «Portugal ainda é dos países da Europa onde muitas famílias têm dificuldade em aquecer ou arrefecer as suas casas. Isso impede escolhas saudáveis e perpétua ciclos de pobreza», explica.

A jurista sublinha que «a pobreza se reproduz porque insuficiências vividas na infância podem marcar toda a vida de uma pessoa». E não fica por aqui: «A precariedade laboral, a má qualidade do emprego e as dificuldades em aceder a habitação afetam profundamente a saúde mental, sobretudo dos jovens, comprometendo a autonomia e os projetos de vida».

O envelhecimento da população, com uma elevada prevalência de múltiplas doenças crónicas, traz um desafio extra para o sistema de saúde. «A partir dos 45 anos, uma percentagem significativa já vive com pelo menos uma doença crónica, e aos 65 anos já são várias. Isso obriga a uma abordagem integrada e complexa, porque tratar uma pode agravar outra».

Para responder a estas complexas realidades, Maria de Belém defende uma visão holística: «Temos de trabalhar com saúde em todas as políticas e atuar muito próximo das pessoas, nos sítios onde vivem e com os seus problemas». Apela a que a saúde seja entendida como um sistema articulado, em que a literacia e a informação são ferramentas essenciais. «A literacia passou a ser fundamental, e a Revista Saúda tem um papel importante nesse sentido. As pessoas precisam de perceber que tudo isto funciona como um conjunto que tem de estar articulado para ser eficaz».

Com o olhar voltado para o futuro, a ex-ministra conclui: «No século XXI, o grande desafio é focar nas condições de vida das pessoas, tal como fizemos no 25 de abril com a saúde materno-infantil. Sem esse foco, o sistema de saúde continuará sob pressão e os anos de vida saudáveis não acompanharão o aumento da esperança de vida».​