Texto de
Ana Rodrigues Silva | Coordenadora de pediatria, Hospital CUF Coimbra e Hospital CUF Viseu
Os bebés choram por múltiplos motivos, desde fome, fralda suja, frio ou calor, desconforto relacionado com a roupa, necessidade de mimo ou proximidade, e tantos outros.
Ao contrário do que era cientificamente aceite no século XIX, quando Emmett Holt, uma das grandes referências na área da pediatria, sugeria que chorar poderia ser benéfico para o desenvolvimento pulmonar, atualmente sabemos que perante um sinal de desconforto do bebé os adultos devem optar por manter a calma. Ou seja, o bebé deve receber uma resposta tranquilizadora de forma a poder melhorar a gestão das suas emoções perante um evento desconfortável. É aquilo a que se chama modulação sensorial.
Não obstante, o choro do bebé deve despertar sempre a atenção. Principalmente porque algumas vezes pode associar-se a outros sinais ou sintomas que sugerem não se tratar apenas de um desconforto menor ou transitório, mas de um sinal de doença.
O choro em contexto de doença é diferente daquele que traduz apenas um desconforto pontual. Os pais conhecem o seu bebé e as caraterísticas habituais do respetivo choro. Mesmo provocado por cólicas do lactente, apesar de exuberante, é um choro descontínuo, alternando momentos de choro com momentos de calma. O choro relacionado com doença é intenso, habitualmente gritado e contínuo. Nota-se uma irritabilidade exagerada acompanhada de choro inconsolável. Perante comportamentos similares ao descrito, os pais devem pesquisar outros sinais de doença aguda, como febre, alterações na pele (ex: pintinhas), vómitos, diarreia ou dificuldade na alimentação. Um choro inconsolável associado a qualquer um destes sintomas deve motivar a procura de observação médica especializada.
Há ainda episódios em que o choro ou a irritabilidade constituem apenas a fase inicial de um episódio de doença. Esteja atento às situações em que o bebé aparentemente melhora o seu choro, mas em que persistem os sintomas acima descritos, ou mesmo agravados, como febre elevada, dificuldade respiratória, ou subsistem dúvidas quanto ao estado de alerta da criança ou bebé. Nestes casos, o bebé deve ser observado.
O choro do bebé não deve ser interpretado como normal. Normal é o contrário: não chorar. O choro pode apenas ser aceite à luz da faixa etária do bebé, como expressão de um senti- mento negativo. Na maioria das vezes, estes episódios são fruto de intercorrências quotidianas passíveis de resolução rápida. Noutros momentos, são manifestações que podem passar com modulação emocional. Por fim, quando o choro surge associado a outros sinais de doença aguda ou quando isoladamente constitui uma alteração do comportamento do bebé persistente, não habitual, deve ser procurada observação pediátrica urgente.