Como já tinha acontecido na primeira vaga de COVID-19, entre Março e Abril de 2020, também agora, no pior pico da pandemia, muita gente perdeu o acesso aos cuidados de saúde primários. Fecharam outra vez extensões de saúde e centros de dia. Muitos centros de saúde ficaram também «quase de portas fechadas» e sem capacidade para atender telefones.
Em muitas localidades isoladas, mas também nas grandes cidades, as farmácias foram chamadas a resolver os problemas de milhares de doentes isolados em casa, com exames, tratamentos e consultas adiados. Foi o que aconteceu no bairro dos Olivais, em Coimbra. «O telefone de apoio acaba por ser o da farmácia», explica a directora-técnica da Farmácia Moço. Ela própria disponibiliza o seu telemóvel pessoal «sempre que é preciso». Em tempo de pandemia, as pessoas têm ainda mais dúvidas para esclarecer.
A farmácia disponibiliza amplas gamas de produtos, entre os quais os ortopédicos
Nos primeiros meses do ano, Maria do Carmo Moço passou muito tempo ao telefone para desbloquear as dificuldades dos utentes. Não foram só os casos das pessoas que, de repente, se viram sem as receitas necessárias para continuarem os tratamentos. Outras apresentavam mesmo problemas que implicavam contactos com os médicos de família, assoberbados a dar resposta aos casos de COVID-19. A directora-técnica ajudou ainda pessoas ostomizadas «desamparadas», a quem não tinha sido dada indicação dos materiais a utilizar. Fez contactos com centros de saúde, equipas de enfermagem e de apoio domiciliário, de higiene e de habitação. Teve trabalho, mas também satisfação profissional. «Todas as situações foram resolvidas!», alegra-se a farmacêutica, reconhecida aos profissionais de saúde e do sector social que atenderam os seus pedidos.
Isabel Cardoso gostava de se vacinar contra a COVID-19 na farmácia, como faz todos os anos para a gripe
A Farmácia Moço disponibiliza amplas gamas de produtos – ortopédicos, dermatológicos e de puericultura, por exemplo – e de serviços, como podologia, nutrição e massagens terapêuticas. «Há mesmo de tudo, como nas farmácias», graceja Isabel Cardoso, 74 anos, antiga chefe de repartição dos recursos humanos do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. «Há sempre uma resposta, um conselho», acrescenta a fiel utente. Acima de tudo, valoriza a abrangência de conhecimentos e o cuidado da farmacêutica. Na véspera, pelas 19 horas, ligou-lhe por causa de uma crise de sinusite. Em Janeiro, deu uma queda, o que pode ser um assunto sério na sua idade. A farmacêutica fez questão de ir a casa da doente confirmar a medida do colete torácico indicado para ela. Entusiasmada e reconhecida, Isabel é capaz de passar horas a desfiar os problemas que a farmácia lhe resolveu nos últimos dez anos. «Qualquer indicação da dra. Carmo para mim é um conselho médico. Confiança total», assegura, rindo. Toma na farmácia as vacinas da gripe e da pneumonia, gostaria de fazer o mesmo com a vacina da COVID-19. «É onde tenho mais confiança e me sinto mais à vontade», assegura.
Maria Helena Martins, 84 anos, acha que esta é «a farmácia certa, no sítio certo e com a farmacêutica certa»
Maria Helena Martins gosta de referir-se à Farmácia Moço como «a farmácia certa, no sítio certo e com a pessoa certa». Aos 84 anos, diz sentir-se «acompanhada e realizada». A farmácia nunca lhe faltou, sobretudo nos momentos difíceis da doença do marido, recentemente falecido devido a um carcinoma na próstata. A farmacêutica levava-lhe os medicamentos e ia fazer-lhe os pensos a casa. Também articulou com a Cruz Vermelha o aluguer de uma cadeira de rodas. «Nunca lhe pago, devo-lhe muitos favores», deixa escapar Maria Helena, comovida. «Tem um coração de mel», concorda Isabel Cardoso.
Quando se deu o novo confinamento geral, iniciado a 15 de Janeiro, multiplicaram-se os pedidos de entregas ao domicílio de medicação urgente e crónica. A equipa, de oito elementos, desdobrou-se para satisfazer todos os pedidos no próprio dia, permitindo aos doentes manterem-se resguardados em casa.
Com a pandemia, a Farmácia Moço passou a dispensar medicamentos e a seguir de perto 12 doentes mais sensíveis, que antes eram obrigados a deslocar-se aos hospitais para levantarem a sua medicação. Margarida Marques, professora primária reformada, de 78 anos, recebe agora em casa as injecções para a insuficiência renal de que precisa. É-lhe «muito útil», garante, mas o que a enternece é a gentileza de uma das funcionárias da Farmácia Moço, que a visita a cada dois dias, há já um mês, para ajudá-la a fazer o penso numa queimadura provocada por chá quente.
A dispensa de medicação hospitalar continua a ser um serviço gratuito. O valor da intervenção farmacêutica deverá ser determinado como resultado dos projectos-piloto em curso em vários hospitais do país.
Nos domicílios, a farmacêutica organiza a medicação dos doentes e deixa preparadas as tomas de cada membro da família, às horas certas, de acordo com a prescrição médica. Mede tensões e glicémias, ouve queixas e verifica sinais de alerta. E aproveita sempre para conversar um bocadinho. Nota que as pessoas andam mais ansiosas, sobretudo os idosos, isolados em casa e afastados da família. «Às vezes, basta uma palavra de carinho ou consolo, uma atenção, e ficam logo mais confortados. A farmácia acaba por ser tudo», resume Maria do Carmo Moço.