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25 fevereiro 2021
Texto de Carina Machado Texto de Carina Machado Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro Vídeo de Hugo Costa Vídeo de Hugo Costa

Palácio Nacional de Queluz

​​​​​​​A casa de campo de três gerações reais.​

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«Houve uma altura em que Lisboa acabava no que é hoje a Praça dos Restauradores. À volta havia muitas quintas. Ainda podemos ver algumas, em Benfica, no Lumiar… Mas o Palácio Nacional de Queluz, pertença da família real, é o melhor exemplo», defende o seu director, António Nunes Pereira.  

O preâmbulo da história real do Palácio Nacional de Queluz começou a ser escrito em 1654, pelo rei D. João IV, numa altura em que era apenas, ainda, o Casal de Queluz, uma quinta campestre da família de D. Cristóvão de Moura, o Marquês de Castelo Rodrigo. Foi este fidalgo, criado na corte de Castela, que mandou construir a casa, na qual se instalava sempre que vinha caçar para a região. Desse início resta a sala de refeição do actual restaurante Cozinha Velha, local onde funcionou também a cozinha do que viria a ser mais tarde o palácio. 


Sala de refeição do restaurante Cozinha Velha, onde se mantêm a mesa de pedra e a chaminé originais, locais de preparação todas as iguarias servidas no palácio

Depois de aclamado rei de Portugal, após a restauração da independência de Espanha, D. João IV decretou o confisco de bens aos apoiantes, ou tidos como tal, da facção contrária. Assim se viu D. Cristóvão de Moura despojado dos seus pertences, entre eles a casa de campo em Queluz, que acabaria, em 1654, por fazer parte da Casa do Infantado, título dado ao dote criado pelo monarca para sustentar os segundos filhos dos reis portugueses. 

Foi só em 1760, com D. Pedro de Bragança, o terceiro senhor da Casa do Infantado, por ocasião do anúncio do seu casamento com a sobrinha e herdeira do trono, D. Maria, que o Casal de Queluz sofreu obras profundas à dimensão de um palácio real. O espaço serviria de lugar de lazer e entretenimento da família real constituída por D. Pedro III e D. Maria I, que passavam largas temporadas na sua quinta de recreio.  

O rei consorte era, segundo o historiador Paulo Drumond Braga, um apreciador de ópera, caçadas, jogos de cartas, corridas de touros… De tudo Queluz foi palco. «Houve uma casa de ópera nestes jardins, uma praça de touros, havia casas de música», revela António Nunes Pereira, recordando ainda que a corte caçava na Matinha, um bosque entretanto seccionado dos jardins do palácio pela estrada do IC19, e que se espera vir, em breve, a ser novamente aberto a visitas públicas. «Uma parte disto perdeu-se, mas Queluz ainda mantém o ambiente de sonho e de prazer despreocupado que presidiu à sua edificação», acrescenta.

António Nunes Pereira defende que o Palácio Nacional de Queluz mantém o ambiente de sonho e de prazer despreocupado que presidiu à sua edificação

Resistiram ao tempo e às vicissitudes muitos elementos, hoje ícones absolutos desse espírito hedonista. Nos jardins de bucho, geometricamente desenhados e animados por cascatas e jogos de água, o canal dos azulejos será, porventura, o maior entre eles. O gigante tanque comprido era alimentado pelo rio Jamor, represado por um sistema de comportas e, quando cheio, era possível passear de gôndola e apreciar as paisagens representadas nos murais de azulejo em toda a sua extensão.  

Ali perto, outro resistente simbólico dos prazeres de D. Pedro III, o jardim botânico, onde se recuperou o cultivo de plantas aromáticas e as quatro estufas onde o monarca produzia exóticos ananases. «O ananás, pela sua coroa, era considerado uma planta real, e são vários os exemplos, na Europa, de palácios onde surgia como elemento escultórico», refere António Nunes Pereira. Esta é uma das áreas do palácio que ao longo do tempo mais sofreu com as sucessivas cheias que assolaram esta parte dos arredores de Lisboa. A zona hoje visitável resulta de um trabalho de reabilitação e reconstituição, que lhe valeu a distinção com vários prémios.  


A recente reconstituição do jardim botânico trouxe de volta as estufas de ananases de D. Pedro III e as plantas aromáticas usadas na cozinha do palácio

Em 1786, D. Pedro III morre. Oito anos depois, um incêndio destrói a Real Barraca da Ajuda, onde a Família Real vivia em permanência desde o terramoto de 1755, e o Palácio de Queluz torna-se a residência oficial da rainha D. Maria I – enlouquecida, entretanto, pela dor das sucessivas perdas, em que se incluíam a do filho varão, D. José, aos 27 anos, e mais tarde a dos príncipes regentes D. João VI e D. Carlota Joaquina. Para acomodar a corte, a guarda e a criadagem, foi necessário construir novas infra-estruturas. 

O palácio, hoje, resulta num edifício feito de acrescentos, barrocos, rococós e neoclássicos, de acordo com os gostos. No interior, ainda há exemplos do que era, como afirma o director do palácio, «o esplendor da corte portuguesa»: a sala do trono coberta de espelhos e talha dourada; a sala da música, em que se destaca o invulgar pianoforte Clementi; ou ​a dos embaixadores, onde se encontram dois pares de tronos, outra raridade em toda a Europa. 

​Pormenor da sala dos Embaixadores, com um dos dois pares de tronos reais

Foi a época das invasões francesas, que se diz terem tido participação da rainha. Em 1807, um dia antes da entrada das tropas napoleónicas em Lisboa a corte foge para o Brasil, marcando o fim dos tempos áureos de Queluz. Catorze anos mais tarde, em 1821, D. João VI regressa a Portugal, mas o palácio só voltou a ser habitado pela rainha D. Carlota Joaquina, em regime de semiexílio, acusada de conspirar contra o marido. Das lendas do lugar faz parte o som dos passos arrastados da sua alma penada, que vagueia, até hoje, pelos corredores do palácio, alegadamente atormentada pela participação na guerra civil que opôs os filhos Miguel e Pedro IV de Portugal, primeiro imperador do Brasil. 

D. Miguel, defensor da causa absolutista, habitou o palácio, enquanto rei, mas foi D. Pedro quem venceu a guerra a favor do constitucionalismo liberal. Estava doente e abdicou do trono, para a filha, D. Maria II, acabando por morrer no Palácio de Queluz, no quarto D. Quixote, onde nasceu. 

D. Maria II casaria, em segundas núpcias, com D. Fernando, um romântico apaixonado por Sintra, que mandou fazer o Palácio da Pena, para onde a corte se deslocaria, deixando de vir a Queluz, que acabaria por ser doado ao Estado pelo último rei português, D. Manuel II.

 

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