Apresentem-se um ao outro.
António Raminhos (AR) – Olá, tenho aqui comigo a Catarina, uma mulher inteligente, dinâmica, responsável, divertida, que me faz rir muito. Tenho inveja das piadas que faz. Muitas vezes digo que não sei escrever piadas, a Catarina é que sabe. Temos um espetáculo em conjunto porque quis aproveitar este talento. Chama-se “Não Perguntamos a Mais Ninguém” e que tem tido salas cheias.
É só o que tem para dizer?
AR – Não. É a companheira da minha vida, sempre foi. Não vejo outra pessoa com capacidade para lidar comigo sem ser a Catarina.
Catarina, é a sua vez.
Catarina Raminhos (CR) – Ao meu lado tenho o António Raminhos.
AR – Mas tens de dizer o que é que eu sou. Eu não sou António.
CR – Em casa é o Tozé. O Tozé faz qualquer um parecer má pessoa, porque é muito bonzinho. Apesar de ter perturbação obsessiva compulsiva (POC), que o leva a centrar-se nas suas questões, pensa muito nos outros, um exercício difícil que faz muito bem. É muito criativo, sempre a pensar em novos programas. Não era uma pessoa muito atenta porque se focava muito nas suas questões, mas foi-se tornando mais atento com o passar dos anos.
AR – Eu não uso a saúde mental como desculpa. É um pormenor, como são o défice de atenção e a hiperatividade, que também tenho.
Como figura pública que é, combate o estigma sobre a saúde mental. Insiste na importância do acompanhamento profissional.
AR – O processo de autoconhecimento e de terapia permite deixar de andar totalmente à deriva. E tenho o meu porto de abrigo, a Catarina. Depois, há outra via que se abre.
«Quem lida com questões de saúde mental tem muita tendência para se fechar sobre si mesmo»
Para além da clínica?
AR – Sim, sim. Antes de mais, eu sou uma pessoa da ciência. Dou primazia àquilo que está estudado e comprovado, mas faço bem a junção com o que me faz bem. Faço psicoterapia há muitos anos, mas já fiz e gosto de fazer reiki. Para mim funciona. Com a meditação é a mesma coisa. Mas pode ser desporto. Às vezes basta ir ao mar, fazer uma caminhada. Coisas que tirem o foco de mim. E que me permitam continuar a viver. Quem lida com ansiedade, com POC ou outras doenças relacionadas com a saúde mental tem muita tendência para se fechar sobre si mesmo. Infelizmente, a maioria não tem capacidade financeira para pagar as consultas. Fala-se muito de saúde, mas saúde mental é a base de tudo. Sem equilíbrio mental não se consegue estar fisicamente bem.
CR – É descurada pelo Serviço Nacional de Saúde. Não há resposta de psicólogos e, infelizmente, a maioria das pessoas não consegue pagar consultas no privado. Quando comecei a fazer psicoterapia, foi para resolver coisas minhas. Mas percebi que passei a ter mais disponibilidade para as questões dele, a perceber melhor os processos, a identificar os gatilhos. Eu não pensava em mim porque tinha um marido que sofria de perturbação obsessiva compulsiva; depois fui mãe e tive as filhas todas de enfiada.
Conheceram-se na faculdade. Foi amor à primeira vista?
CR – Não, não. Até foi embirração à primeira vista, porque quando o conheci achei-o irritante.
Conheceram-se há 26 anos na faculdade, em outubro. Em março já namoravam e nunca mais se largaram
Ainda acha?
CR – Algumas vezes.
AR – Sou muito chato, muito irritante.
CR – E eu sou muito teimosa.
AR – Além disso é muito amorosa, mas eu posso ser irritante.
O humor está no seu ADN?
AR – Sempre fez parte da minha vida, mas na ótica do utilizador. Quando o jornal em que trabalhava [A Capital] fechou, fui para o desemprego. Fiquei com muito tempo livre. Comecei um blogue, o “Samouco ao Rubro” [na época, moravam em Alcochete, perto das salinas do Samouco]. Era uma forma de estar entretido. Ia escrevendo, fazendo guiões, comecei a ter algum feedback. Foi o início dos blogues. Em simultâneo, assistiu-se ao crescimento da stand up comedy. Entrei em contacto com alguns comediantes do programa “Levanta-te e Ri” e um deles, o Carlos Moura, desafiou-me a experimentar uma noite de comédia. Correu bem. Pouco depois começou o programa “Sempre em Pé”, na RTP2. Estavam à procura de comediantes. Enviei uns vídeos de atuações minhas e fui escolhido.
Quando percebeu que o humor ia ser profissão?
AR – Foi muito simples: entre ganhar mal a ser jornalista e ganhar mal a fazer uma coisa de que eu gosto, com feedback imediato... prefiro a segunda hipótese.
A Catarina trabalhou em televisão.
CR – Sim, e como a maior parte das pessoas sabe, ou pode imaginar, é uma vida muito desgastante, sem horários. Eu era diretora de conteúdos da Warner quando fiquei grávida pela terceira vez. Percebi que era impossível equilibrar a vida pessoal com a profissional.
Raminhos diz que a mulher tem muito mais graça do que ele e devia ser ela a fazer os textos
O Raminhos é influencer?
AR – Influencer, nunca! Não sei. Quando temos de preencher as fichas da escola das miúdas, com a profissão do pai, nunca sei o que escrever.
É um bocadinho incontornável assumir que o Raminhos é influencer.
AR – Durante a pandemia foi isso que salvou a família.
Um influencer que procura ajudar outros?
AR – Nesse sentido sim, para as pessoas entenderem que não estão sozinhas. Cada um está no seu processo, mas não estão sozinhas. Quando alguém diz «estamos todos no mesmo barco»… NÃO, não estamos todos no mesmo barco. Estamos todos no mesmo mar.
Gostam da vida que têm?
CR – Gosto, sim.
AR – Gostava de não ter metade das ****** que me passam pela cabeça.
Insistem que o processo de autoconhecimento exige muito esforço e trabalho. Conseguem fazer um paralelismo com a vossa relação?
AR – O paralelismo é a cumplicidade e o trabalho, porque tudo dá trabalho. Os percursos profissional e pessoal são fruto de imenso trabalho, muito consciente.
CR – Nós falamos sobre tudo. A comunicação é vital.
AR – Haja o que houver entre os dois, sabemos que nunca estamos sob ataque. Se calhar é tão simples quanto isso.
Catarina é muito bem-disposta, António Raminhos confessa que divertir-se não lhe é um processo natural
O que vos faz saltar da cama?
CR – Viagens! Pode ser um fim de semana cá dentro, não precisa de ser uma viagem prolongada. Eu adoro viajar, adoro a sensação de estar num sítio novo.
AR – Ai, Catarina, ****, não, isso não me faz saltar da cama. O que ela gosta é de andar a laurear. Eu sou demasiado depressivo, não há nada que me faça… Não é um processo natural divertir-me. Dizem que o humor salva. Para mim, é mais uma maneira de me tirar de dentro de mim.
Têm a vossa farmácia?
AR – Sou dos Olivais e desde pequeno sempre gostei muito de farmácias. Não sei se já tem a ver com as minhas cenas da saúde. Tenho amigos que trabalham em farmácias e falam muito da importância da ligação à comunidade.
CR – As farmácias são fundamentais na saúde em vários domínios, não é só na dispensa de medicamentos. Por exemplo, uma das últimas vezes em que fui à farmácia teve a ver com uma infeção urinária. Fiz um teste e o farmacêutico, que nos conhece bem, para além do medicamento dispensou um probiótico para tomar depois.