Uma das decisões que Joana Vasa tomou menos de 24 horas depois de ser operada a um cancro da mama, em outubro de 2023, foi a de partilhar o que sucedera, através das redes sociais da sua marca de roupa de banho para mulheres. Depois de uma breve descrição do que se tinha passado, pediu: «Olhem por vocês. Façam os vossos rastreios. Apalpem as vossas maminhas. E sobretudo nunca tenham medo de um diagnóstico».
Ainda hesitou, com receio de ser mal compreendida e de focar demasiado em si a marca ― Hopiness ― que partilha com a irmã. No final, arriscou. Falou mais alto a vontade de aproveitar uma plateia de mulheres para ser um exemplo de que «pode acontecer a quem tem 37 anos e não tem sintoma nenhum», explica. «Eu não tinha um nódulo, eu não tinha nada. Isto pode acontecer e é preciso que as pessoas percebam que a prevenção é muito importante», alerta.
O resultado da publicação foi muito positivo. «Parece que é cliché, mas é verdade. Se eu conseguir ajudar uma pessoa que seja, já me dou por satisfeita». Através de repostas à sua publicação e de mensagens que recebeu, mulheres que já não faziam mamografias e ecografias mamárias há muito tempo disseram-lhe que tinham decidido marcá-las. Outras «começaram a insistir com a mãe e a avó para as irem fazer». Outras ainda, as que tinham ficado com uma primeira opinião para verificar como estavam dentro seis meses, acabaram por marcar consulta para receber uma segunda opinião médica.
Através da partilha da sua história, apontou para os benefícios do diagnóstico precoce
Muitas pessoas têm medo de ouvir uma notícia negativa, mas «não saber é pior», afirma Joana, «a nossa vida é mais valiosa do que o nosso medo», avisa. «Não podemos ter medo de um diagnóstico, se isso for salvar a nossa vida. No meu caso, a vida não esteve em risco, mas há outros em que tal acontece e é assustador. Não dá para “deixar andar”». Através da partilha da sua história, quis ainda mostrar os benefícios do diagnóstico precoce. «O ”deixar andar” é a diferença entre podermos ter um tratamento menos invasivo ou não».
Aos 37 anos, Joana começou a sentir «uns puxões» na zona da axila, no lado esquerdo, que atribuiu ao boxe que praticava. «Por descargo de consciência», e porque uma avó e uma prima tiveram cancro da mama, marcou uma consulta de ginecologia. Pediu que lhe prescrevessem uma mamografia e a ginecologista, ao conhecer o seu historial, acedeu. «Sabe quando há ali qualquer coisa que lhe diz ”vai fazer?”. Foi isso». Terminado o exame, a técnica pediu-lhe para não se vestir, pois tinham detetado algo que carecia de uma mamografia aumentada. Foi nesse momento que percebeu que alguma coisa não estava bem: «Pensei “pronto, já foste“». A médica tinha detetado umas microcalcificações na mama direita ― não na esquerda que a levara à consulta — que lhe geraram muitas dúvidas. A sugestão foi aguardar seis meses e repetir os exames.
Joana não conseguiu ficar à espera e pediu uma segunda opinião. «As redes sociais têm coisas más, mas também coisas muito boas», diz. «No dia da mamografia, tinha feito uma publicação a dizer que a estava a fazer, e a perguntar às mulheres se já tinham feito a sua este ano, uma coisa desse género». Uma seguidora, que hoje é sua amiga, mandou-lhe uma mensagem: «se precisares de alguém incrível para te ver os exames, diz-me», oferta que acabou por ser determinante. A nova médica, ao analisar os exames, explicou que a única forma de tirar as dúvidas era fazer uma biópsia. O resultado confirmou os seus receios: tinha cancro. «Dentro das microcalcificações que eu tinha, havia focos tumorais, mas in situ [não se tinham espalhado]». Ainda assim, no dia da cirurgia, por insistência do médico radiologista foram descobertos mais dois outros focos.
Acabaria por fazer 21 sessões de radioterapia, por insistência da sua médica, que não quis correr riscos. Se a fase final deste processo não foi fácil, também não o foi a que se seguiu: a adaptação à medicação hormonal, que terá de fazer durante cinco anos, e a conduziu a uma menopausa precoce, aos 37 anos. Sente dores articulares e conta que a sua resistência aos picos de trabalho e ao cansaço «é completamente diferente». Diz, a sorrir, que vive «no corpo de uma mulher de 70 anos». A medicação também fez Joana perder quase dez quilos, ela que afirma nunca ter sido magra, porque «ficava muito maldisposta, não conseguia comer nada».
Dar confiança, conforto e elegância às mulheres é o propósito da marca criada por Joana em 2013
O peso, aliás, foi o fator que, somado à dificuldade que a irmã sentiu em encontrar um fato de banho no qual se sentisse confortável no seu corpo de mãe, as levou a fundar a Hopiness, povoando as suas redes sociais de mensagens de autoestima, afirmação pessoal e feminina, com modelos para todos os tipos de corpo, e os seus fatos de banho e biquínis vestidos por manequins elegantes, mas com curvas evidentes, ao contrário do que é habitual.
«Sempre lidei com algumas questões de peso, tanto que aos 19 anos isso me levou a uma anorexia. Passei por todo esse processo, e a imagem sempre foi algo com que me preocupava muito e com que tinha imensa dificuldade em lidar», explica. Entre outros episódios, recorda que, na adolescência, chegava a ir para a praia e não se despia, «passava o dia de calças e top» ou «ia tapada com uma toalha, até chegar ao mar».
Nesse período, Joana foi acompanhada por uma equipa de médicos de várias especialidades e precisou mesmo de ser internada durante uma semana. Foi durante o seu internamento que se «deu o ”clique”», provocado por um jovem enfermeiro que a interpelou. «”O que estás aqui a fazer?”. As conversas que foi tendo comigo foram do género “acorda para a vida, tens o tempo inteiro do mundo pela frente”». Com muito trabalho pessoal, ultrapassou o distúrbio alimentar. Hoje, através da sua marca, quer passar uma mensagem que encoraje a autoestima de pessoas que não lidam bem com a sua própria imagem. Sabe que é um processo que se constrói, e o que mais a satisfaz na marca é quando recebe uma mensagem de alguém que vestiu uma peça das suas coleções, foi «para a praia, estava superconfiante e já conseguiu ir caminhar à beira-mar sem ter vergonha ou sem vestir uma t-shirt». No fundo, espera que o seu projeto seja um empurrão para que as mulheres que mais estão a precisar se sintam «confortáveis na sua pele» num local onde se sintam particularmente expostas.