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3 agosto 2016
Texto de Rita Leça Texto de Rita Leça Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro

«Os dentes dos jovens portugueses parecem pó»

​​​​​Sentámo-nos na cadeira do “dentista dos famosos” para ver como trabalha.​

​Revista Saúda - Deu um novo sorriso a pessoas famosas como Paulo Portas e Cristiano Ronaldo. Por isso, é conhecido como o “dentista dos famosos”. Gosta desse rótulo? 

Miguel Stanley - Honestamente, acho que não me favorece. E nunca fiz por isso. O público só sabe que são meus pacientes por causa dos media e das redes sociais. Nunca por mim. Ninguém vai saber que tipo de tratamentos lhes fiz. E espero que as pessoas que têm menos posses financeiras não se sintam melindradas, porque nós estamos aqui para as tratar.​

RS - Mas há a questão do preço, que melindra um pouco mais… 

MS - É legítimo que as pessoas queiram saber o custo das coisas. Mas o mais difícil é sabermos o valor das coisas. Nós usamos a boca sempre. Sorrimos com ela, comemos com ela, amamos com ela. É uma arma social muito importante. Somos considerados mais competentes, inteligentes e simpáticos quando temos um sorriso saudável e bonito. Por isso, não é um custo, é um investimento.

RS - Considera que os portugueses têm bons dentes?

MS - Sim! Muitas vezes, as pessoas vêm à clínica a achar que têm maus dentes e, quando vejo, concluo que os dentes saudáveis, que nunca foram mexidos, são bons e o que está mal é o resultado de tratamentos médicos antigos. Além disso, a higiene oral também podia ser melhor. Mas as gerações mais jovens têm mais cuidados e, por isso, acredito que este é um problema que se vai extinguir nos próximos 20 anos.

RS - Que conselhos práticos pode dar aos nossos leitores?

MS - Invistam em consultas regulares no dentista e no higienista oral. Eduquem os vossos filhos a ir ao dentista desde cedo. Em segundo lugar, usem o fio dentário: aproveitem aqueles minutos no duche quando estão à espera que o condicionador actue. Mesmo que não tenham dinheiro, peçam um diagnóstico e um plano de tratamento total. Não deixem que seja o dentista a tomar as rédeas da vossa saúde. E ponham sempre a saúde à frente da estética. Tratem das cáries e das gengivas primeiro e só depois devem preocupar-se em pôr coroas, implantes e essas coisas complicadas e caras.

RS - É possível ir a uma consulta e pedir só o diagnóstico?

MS - Sim. Em Portugal, qualquer médico dentista tem o dever e a obrigação de apresentar um plano de tratamento íntegro para recuperar a saúde oral e entregar um orçamento detalhado para o mesmo.

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RS - Como vê as farmácias para o exercício da sua profissão?

MS - As farmácias portuguesas estão incrivelmente avançadas e, em relação aos produtos de cuidado oral, muito bem equipadas. Sabia que a Clorexidina, por exemplo, é muito difícil de encontrar nos EUA e em Inglaterra? Felizmente há cá, pois é um dos melhores produtos para infecção oral que receito.

RS - Sempre quis ser dentista? 

MS - Não. Gosto de pensar em mim como alguém muito criativo, que agarra em coisas e as transforma.Sendo médico dentista, consigo transformar bocas destruídas em sorrisos. Sou um designer de sorrisos. Quando era mais jovem, queria ser cirurgião cardiotoráxico, porque gosto de ajudar pessoas. Quem me conhece intimamente sabe que sou muito generoso com o meu tempo para ajudar pessoas. Talvez seja pela minha educação católica.

RS - É católico praticante?

MS - Casei pela Igreja, estudei muitos anos nos Salesianos do Estoril. A minha mulher é ortodoxa. Não sou fanático, mas acho que a fé é importante e ter a humildade de pedir ajuda a alguém acima de nós é inteligente. Acredito no destino, mas cabe-nos a coragem de agarrar as oportunidades.

RS - Considera-se corajoso?

MS - Acho que o meu histórico o prova. Senão, tinha ficado pelo caminho.

RS - Como foi começar de novo depois de ter sido obrigado pelas Finanças a declarar insolvência há cinco anos, devido ao seu contabilista?

MS - Foi uma viagem incrível, a nível humano. Recebi muitos pedidos para falar sobre o assunto, para dar cursos… A minha falência não aconteceu por minha causa, foi um acto criminoso! Tive sucesso muito rápido e muito jovem. E sangue na água atrai tubarões. Mas se o sucesso à primeira pode ser apenas sorte, à segunda já não.

RS - O que mudou na sua carreira? Eram outros tempos, de grandes  investimentos.

MS - Hoje, tenho outra forma de pensar. Não me considero um empresário e o meu grande prazer é acordar e deitar-me todos os dias com a certeza de que fiz um bom trabalho. E, nesse sentido, gostava que as pessoas fossem mais exigentes também. Consultas de 15, 20 minutos são impensáveis. Por isso, mandei registar, a nível europeu, o conceito slow dentistry. Essa vai ser a minha nova aventura: tentar inspirar pessoas, governos, médicos, empresários e seguradoras para exigirem que o acto dentário tenha o tempo mínimo de uma hora.

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RS - Agora tem uma clínica sua, a White Clinic, em Miraflores. 

MS - Com seis gabinetes de atendimento dentário e cerca de 35 funcionários. Também tenho um gabinete de estética e outro de nutrição. Aqui a política é no stress. Sou um dos dentistas mais conhecidos, mas não tenho redes de clínicas. E não me faltam empresários a apresentar projectos de investimento. Aprendi, da pior maneira, que não se come dinheiro.

RS - Deu a volta às adversidades num momento de grave crise económica. Sente-se um vencedor?

MS - Sem dúvida! Mas não foi uma experiência solitária, tenho um enorme orgulho na equipa que continuou comigo nesses tempos conturbados. Eu nunca falava disto e todas as noites sonhava em matar a pessoa que me roubou que, ainda por cima, estava livre. Até que houve um momento inspirador.Numa palestra, em Zurique, decidi falar abertamente e contar a minha história: «Tinha tudo e perdi tudo!» Foi incrível o apoio que recebi. As pessoas vieram falar comigo no final, algumas editoras propuseram-me escrever sobre o tema. Espero que a minha experiência sirva de ensinamento para muita gente. Eu já aprendi! 

RS - Os programas na TV, “Doutor, Preciso de Ajuda” (TVI, 2006) e “Dr. White” (SIC, 2011/12) ajudaram-no a sair da crise? 

MS - Sim, sim! Foi um choque de adrenalina para o qual não estava minimamente preparado. Estive quase sete anos no ar e ainda hoje sou conhecido como “dr. White”. De repente, comecei a ser reconhecido e isso foi engraçado.  Mas esqueço-me de que sou famoso.

RS - Não gosta da fama?

MS - Gosto tanto da fama como de ser alto no autocarro (risos). Felizmente, só sou famoso em Portugal, e já não tanto. Mas estou grato e acho que contribuí para a minha indústria. Antes dos programas, o dentista era visto como alguém que arranjava cáries e arrancava dentes. Depois, a indústria cresceu 40% e abriram mais três faculdades. Gosto de pensar que influenciei algumas pessoas a serem dentistas.

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RS - Nunca pensou em emigrar? 

MS - Vivi seis meses em Los Angeles, onde participei no programa “The Doctors”. Adorei! Califórnia é o sonho americano, onde toda a gente quer viver, mas Portugal dá 10 a zero à Califórnia. As nossas paisagens são lindas e a alimentação é incrível! asha, a minha mulher, só come coisas orgânicas e da estação, e vê-se a qualidade dos nossos produtos. Adoro viver em Portugal e acredito que ainda se pode reverter essa tendência da alimentação produzida à base de químicos e do fast food. As novas gerações que se alimentam de fast food têm uns dentes que parecem pó. Ponho uma broca nos dentes de uma pessoa mais velha que vive na aldeia e são a coisa mais densa que se pode encontrar.

RS - E agora, o que ainda lhe falta fazer?

MS - Estou a escrever um livro sobre medicina dentária e a terminar um livro infantil com as histórias que o meu pai, que faleceu há três anos, me contava em criança. Já contratei uma ilustradora e espero que seja lançado em Setembro, no Reino Unido. Também gravei um álbum com músicas escritas e cantadas por mim, com uma banda incrível. Está há seis anos fechado num cofre porque sempre tive receio em lançá-lo. Gostava muito, ainda, de fazer um musical em filme de animação, baseado no meu livro infantil. E de ter filhos, claro! Espero que seja no ano que vem.​