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4 agosto 2022
Texto de Vera Pimenta Texto de Vera Pimenta Fotografia de Ricardo Castelo Fotografia de Ricardo Castelo Vídeo de Nuno Santos Vídeo de Nuno Santos

Viagem pelos sentidos

​​​​​​​Braga é um segredo à espera de ser desvendado.​

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​Do alto do Bom Jesus do Monte, Braga emerge em toda a sua história e imponência. Fundada pelos romanos há mais de 2.000 anos, a antiga Bracara Augusta foi a primeira cidade portuguesa e é uma das cidades cristãs mais antigas do mundo.

Entre os jardins, lagos e miradouros que adornam o santuário, a Basílica do Bom Jesus impõe-se como lugar de devoção, dando as boas-vindas aos milhares de peregrinos e turistas que a cada ano por ali passam.

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O escadório do Bom Jesus é a imagem de marca de Braga

No seu adro termina o emblemático escadório, cartão de visita da cidade, composto por mais de 500 degraus divididos em três grandes lanços. O Escadório do Pórtico marca o início do percurso e permite conhecer as primeiras dez capelas da via-sacra, de um total de 19 espalhadas ao longo do conjunto arquitetónico e paisagístico.

O segundo, apelidado de Escadório dos Cinco Sentidos, tem cinco patamares, cada um ornamentado com uma fonte em representação de um dos sentidos. Por fim, o Escadório das Três Virtudes apela à fé, à esperança e à caridade.

«Germain Bazin [historiador e curador no Museu do Louvre] descreveu o Bom Jesus como o mais belo sacromonte da Europa», conta Varico Pereira, vice-presidente da Confraria do Bom Jesus do Monte. O santuário, pensado inicialmente enquanto espaço de peregrinação «para todos os crentes impossibilitados de visitar a Terra Santa», é hoje uma paisagem cultural de referência, classificada, desde 2019, como Património Mundial da UNESCO.

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Localizada no centro histórico da cidade, a Sé de Braga ​destaca-se por ter sido a primeira catedral do país​

Caminhar pelo centro histórico de Braga é deixar-se envolver pela típica atmosfera calorosa do Minho. A cada esquina há pequenas lojas de comércio local à espera de serem descobertas, restaurantes tradicionais que convidam a almoços demorados, e monumentos que contam a história daquele que, em 2021, foi considerado o melhor destino europeu. A votação online, promovida pela European Best Destinations, descreve Braga como uma das cidades mais felizes da Europa, destacando-se pela qualidade de vida, cultura, Natureza e espiritualidade.

Foi em plena Avenida Central, no coração de Braga, que a farmacêutica Joana Rodrigues passou grande parte da sua vida. A paixão pela farmácia «está no sangue» da família há várias gerações, desde o tempo dos bisavós. «Foi a profissão que escolhi e em que me sinto mais realizada», explica a proprietária da Farmácia Araújo Rodrigues.

Ao passar pelo número 118 da avenida onde Joana cresceu, é impossível ignorar a emblemática Casa Rolão. O edifício barroco do século XVIII, que chegou a ser sede do Diário do Minho e até uma loja de tratores, foi, a partir do final dos anos 80, palco de ensaios de várias bandas de rock da cidade, em particular dos Mão Morta, que aí gravaram alguns dos seus discos.

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Nascida e criada em Braga, a farmacêutica Joana Rodrigues confessa-se​ uma eterna apaixonada pela sua cidade

A montra do piso inferior oferece um vislumbre do enigmático corredor principal da Livraria Centésima Página, ali instalada desde 2005. Pintado de prateleiras do chão ao teto, o espaço convida os visitantes a estar com os livros, sem barreiras.

O conceito «vai muito além dos livros», como explica a coproprietária, Helena Veloso. É também local de exposições, ateliês, venda de artesanato, música e até de uma esplanada silenciosa no centro da cidade.

No Largo de Santiago, o Seminário Conciliar de São Pedro e São Paulo é o guardião de um dos segredos mais bem guardados da cidade. No segundo andar, numa antecâmara de paredes negras envolta numa aura de misticismo, está instalada a Capela Árvore da Vida.

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A Capela Árvore da Vida foi desenhada para lembrar um passeio no bosque

Construída com 20 toneladas de madeira e sem utilizar um único prego, a capela foi inspirada num estilo de arquitetura moderno e disruptor. A sua singularidade valeu-lhe o prémio internacional de melhor espaço de arquitetura religiosa pelo ArchDaily, em 2011.

Banhadas apenas pela luz natural das duas janelas que iluminam o espaço, as tábuas de madeira de diferentes larguras criam a ilusão de uma caminhada pelo bosque. O ranger dos passos, a textura dos materiais e o cheiro inconfundível da madeira enchem o espaço, numa experiência multissensorial.

«É essa abertura dos sentidos que nos permite habitar o lugar com outra qualidade», afirma o padre Joaquim Félix, professor de teologia na Universidade Católica Portuguesa. O objetivo foi criar um espaço aberto a partir do interior e «uma metáfora de eternidade», não só no sentido da religião, mas também da sustentabilidade. «A capela está preparada para ser desmontada e levada para outro lugar, perspetivando um tempo que vai para além das nossas vidas», conclui.

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No gnration há exposições multissensoriais onde ciência e arte andam de mãos dadas

A propósito da eleição de Braga para Capital Europeia da Juventude, em 2012, foi no antigo quartel da GNR que nasceu o gnration. O conceito, nas palavras do diretor artístico Luís Fernandes, assenta na promoção da música contemporânea, e da relação entre a arte e a tecnologia, numa lógica de abertura permanente à comunidade bracarense.

«É um espaço multifacetado, gratuito e aberto a toda a gente», conta a farmacêutica e visitante assídua Joana Rodrigues. Além das exposições onde a ciência e a arte se encontram, em agosto as sessões de cinema ao ar livre vão ocupar o pátio interior do edifício todas as quintas-feiras.

Na Parada de Tibães, a Galeria Mário Sequeira recebe os visitantes como convidados numa casa de família. O espaço, inaugurado em 1994 no rés-do-chão da vivenda familiar, conta hoje com uma moderna galeria construída no mesmo terreno, cujas exposições se prolongam por um parque verde, com esculturas de artistas internacionais instaladas ao ar livre.

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O edifício principal​ da Galeria Mário Sequeira é da autoria de Carvalho Araújo

A visita guiada é personalizada aos interesses de cada um, num passeio que vai muito além da apreciação de quadros. «É como se estivéssemos num mundo à parte», observa Joana. «É isso que sinto quando lá vou».

A ideia nasceu da paixão do proprietário pela arte contemporânea. «Eu sempre tive o bichinho da arte e isto é também o resultado de muitas viagens», acrescenta Mário Sequeira, médico cardiologista.

No pôr do sol dos dias longos de verão, a esplanada da Tasca do Paiol convida a encontros à mesa, embalados pelos mais típicos petiscos minhotos. No espaço, decorado a rigor, há mesas de madeira, com toalhas quadriculadas, e bancos à medida de uma família.

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Na Tasca do Paiol há petiscos minhotos, servidos em doses para partilhar​

Na hora de petiscar, os presuntos pendurados no teto são cortados em fatias finas, complementados com queijos trufados, pão tradicional e enchidos acabados de sair da brasa. Tudo servido em doses pensadas para partilhar. «É uma verdadeira tasca na essência da palavra», diz Joana, sorridente. «Onde toda a gente se conhece e se levanta a meio do jantar para cumprimentar quem está na mesa no lado».

À moda do Minho, em Braga as pessoas são recebidas de braços abertos, como uma família, e convidadas a experienciar a cidade numa viagem que é uma ode aos cinco sentidos: observar a paisagem, ouvir a história, saborear a gastronomia, folhear um livro, sentir o cheiro da madeira. E descobrir, por fim, que o segredo para a felicidade pode estar nas mais pequenas coisas da vida.

 

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