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19 março 2018
Texto de Paulo Martins Texto de Paulo Martins Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro

«Quando vi o arquivo, fiquei fascinada»

​​​​​A coordenadora científica do Elephante é investigadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa.

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​REVISTA FARMÁCIA PORTUGUESA: Qual a relevância, para a academia, de um projecto desta natureza?
ANA PAULA PIRES: Para a academia – e, em particular, para nós, Instituto de História Contemporânea (IHC) – têm muita relevância as ligações à sociedade civil. É algo que faz parte dos objectivos do Instituto desde a sua fundação. Não temos a ideia de uma academia fechada, mas de procurar enquadrar a sociedade na produção de conhecimento. Pela sua relevância, a Associação Nacional das Farmácias (ANF) cumpre muito bem estes objectivos. Não podemos esquecer-nos de que quando temos um problema de saúde a primeira linha é sempre o farmacêutico. Devo louvar a sensibilidade da ANF para a necessidade de preservar o seu património histórico.

O IHC recebe habitualmente propostas deste tipo, de outras instituições?
Sim. Há anos tivemos um projecto, ainda coordenado pela professora Fernanda Rollo, intitulado “História e Património do Grupo Portugal Telecom”, que durou quatro ou cinco anos. Foi uma encomenda directa da empresa, que pretendia preservar esse património. Mais recentemente,
temos o caso do Comité Olímpico de Portugal, que nos procurou com a mesma intenção. E está a decorrer um projecto tendo em vista a preservação da história da Polícia de Segurança Pública, cujo objectivo final é a constituição do Museu da PSP. Portanto, há instituições que têm esta sensibilidade.

No caso da ANF, uma das componentes do projecto é produzir uma monografia sobre o Grémio Nacional das Farmácias. É um pouco a história do regime corporativo que está aqui em causa?
É a história do regime corporativo e da própria economia de guerra, que foi sendo montada durante a II Guerra Mundial. O Grémio surge num período em que Portugal, apesar de neutral, sofre os impactos e as consequências da guerra. Isso também se reflecte nas farmácias. Alguns dos documentos que estão no vosso arquivo mostram precisamente a forma como as farmácias passaram a vender açúcar e a ter um controlo bastante pesado da comercialização e, até, do tabelamento de preços. Algo que hoje em dia consideramos quase inconcebível, mas que revela a centralidade e a dimensão abrangente do Grémio no controlo e na comercialização de produtos essenciais. Hoje em dia, não associamos o açúcar à produção de medicamentos, mas a verdade é que está lá.

Que expectativa tem em relação ao que pode encontrar? Trata-se de documentos que, em alguns casos, estão agora a ser recuperados…
Tenho muitas expectativas. Numa das primeiras visitas que fiz à ANF, quando me mostraram o arquivo, fiquei fascinada. Porque apesar de tudo o que tem de ser recuperado, já foi feito um trabalho de preservação bastante considerável. Alguns dos documentos são, a meu ver, preciosos. O facto de haver cartas redigidas por farmacêuticos reclamando com o presidente do Conselho, ainda Oliveira Salazar, sobre determinadas circunstâncias do funcionamento da sua actividade profissional, é de uma riqueza fantástica, porque permite embrenharmo-nos realmente na sociedade portuguesa de então. Não estamos a falar de estruturas ao nível ministerial, mas a ver aquilo que eram as necessidades da população comum. A ANF tem vindo a fazer um trabalho bastante válido ao nível das memórias dos farmacêuticos. Esse trabalho, que ocupa um espaço considerável na revista Farmácia Portuguesa, é de louvar. São fontes essenciais para a produção da monografia do Grémio, porque muitos farmacêuticos ainda viveram o período do Estado Novo. Tenho várias expectativas. Até porque é um trabalho inovador. Apesar de alguns escritos dispersos, mais focados no período pós-25 de Abril, não
há nada sistematizado sobre o Grémio. Para mim, é um desafio. 

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