Sempre que Carolina Duarte corre na pista de atletismo conta apenas com a sua visão periférica. «Estou a olhar, vejo uma mancha, não estou a ver para a frente, mas estou a ver as linhas», relata. Atleta paraolímpica, prestes a competir em Paris, está em igualdade de circunstâncias com as suas colegas da categoria T13 (a categoria de deficiência visual paraolímpica em que os atletas veem melhor). Isso não acontece, porém, quando corre em competição regular, como aconteceu num recente campeonato nacional.
«Só faço as provas exclusivas do desporto adaptado em europeus, mundiais e Jogos Olímpicos, porque cá em Portugal eu sou a única da minha categoria», explica. «Então eu corro sempre com as [atletas] do regular, porque como a minha categoria de deficiência permite que eu corra num corredor sozinha e sem guia. É como se eu tivesse as mesmas condições que as outras». Como se fosse simples, acrescenta: «Simplesmente, vejo pior». São os «pixéis» que os seus olhos «conseguem ver» que a orientam na pista e não a deixam pisar a linha, o que a desclassificaria. Quem a observa não percebe que vai virando o olhar de um lado para o outro, enquanto dá o seu melhor para chegar o mais rapidamente possível à meta.
Se corre com as atletas do atletismo regular, também treina com elas, desmistificando a ideia – pelo menos na sua categoria – de que participar no desporto adaptado é encarado com facilitismo e menor exigência. A própria Carolina assume um passado com «esse estigma», que afinal se revelou o oposto da sua atual prática de treino diária. «Não tenho abébias, como nós dizemos», afirma com uma gargalhada. E nem sempre é fácil. «As barreiras são um perigo de vida» - assume, novamente a rir - «faço cheia de medo». E continuará a fazer «porque é importante» e porque acredita que vê «o mínimo suficiente» para conseguir ultrapassá-las sem cair. «Se alguma vez for para o hospital porque caí numa barreira, se calhar vou deixar de fazer», conclui, sem perder o humor.
O atletismo é essencial para a sua vida. Por isso acredita que todos podemos fazer desporto, mesmo sem todos serem «atletas campeões». Aos pais de crianças com algum tipo de deficiência, lembra a importância do desporto para os filhos se «integrarem mais na sociedade e sentirem-se mais motivados e empoderados». Ao mesmo tempo, dá resposta a quem duvida da existência de «treinadores competentes» e receia que as crianças «vão estar desamparadas ali a correr e a chocar nas paredes». Pelo contrário, qualquer tipo de pessoa pode integrar-se, acredita. «Tem de haver vontade e algum conhecimento, como é óbvio, perceber quais são as limitações, como a pessoa se adapta». Quanto ao mais, «é fazer a experiência, ver se resulta».