Texto de Mariza Fevereiro Martins | Médica especialista em oftalmologia, Hospital CUF Descobertas
Ao nascer, o bebé entra num mundo novo, repleto de luz, formas e cores ― uma realidade ainda desconhecida para os seus olhos. Embora o aparelho visual já esteja formado, a visão é imatura e desenvolve-se gradualmente, em articulação com o cérebro, nos primeiros meses e anos de vida. Conhecer os marcos deste processo ajuda os pais e cuidadores no acompanhamento do desenvolvimento visual e a perceberem os sinais que justificam atenção médica.
Nos primeiros dias, o bebé vê apenas sombras e contornos. A acuidade visual ― capacidade de distinguir detalhes ― é baixa e o foco limita-se a 20-30 cm, como o rosto da mãe na amamentação. Há preferência por rostos humanos e padrões simples, a preto e branco. Ao longo do primeiro mês, a retina continua a desenvolver-se, as pupilas aumentam e o bebé começa a prestar mais atenção a objetos grandes e coloridos. Distingue primeiro o vermelho, o amarelo e o verde, e mais tarde o azul. Estímulos visuais variados, como brinquedos e decoração contrastante, favorecem este processo.
Entre o primeiro e o terceiro mês, o bebé passa a fixar o olhar de forma mais estável, seguir objetos em movimento e reconhecer rostos familiares, podendo surgir o sorriso social. É normal que ocorram episódios breves de estrabismo (desvio ocular), mas se forem fre- quentes ou persistirem após quatro meses deve ser consultado um oftalmologista.
Entre os três e os seis meses, a visão torna-se mais nítida e melhora a perceção de profundidade. Por volta dos cinco meses, o bebé tenta alcançar objetos, desenvolvendo a coordenação entre o olho e a mão. Dos seis aos 12 meses, a visão aproxima-se da de um adulto. O bebé reconhece rostos à distância, segue movimentos com mais precisão e avalia melhor as distâncias. Por volta dos nove meses, a cor dos olhos tende a estabilizar. Nesta fase, deve evitar-se a exposição a ecrãs, pois o brilho e o estímulo passivo podem diminuir o interesse pelo mundo real e aumentar o risco de miopia.
À nascença, todos os bebés devem realizar o “teste do reflexo vermelho”, feito pelo pediatra na maternidade, que permite detetar algumas doenças, como a catarata congénita. Em caso de suspeita, é essencial a avaliação por um oftalmologista.
Os bebés prematuros têm maior risco de alterações visuais, sabendo-se que a retinopatia da prematuridade pode, em alguns casos, afetar gravemente a retina. Outros problemas, como estrabismo ou erros refrativos (miopia, hipermetropia e astigmatismo), também são frequentes e podem surgir mais tarde.
Na consulta de oftalmologia é possível identificar precocemente alterações e esclarecer dúvidas. Ao longo do crescimento, há fases-chave em que devem ser feitos rastreios visuais para garantir o diagnóstico e tratamento atempados.
Os sinais que devem motivar avaliação médica incluem: ausência de contacto visual aos dois meses; desvio frequente de um olho após os quatro meses; remelas ou vermelhidão persistentes; excesso de lágrimas; sensibilidade à luz; esfregar os olhos; pupila branca visível em fotos; e inclinação constante da cabeça.
Acompanhar o desenvolvimento visual do bebé, promover estímulos adequados e procurar ajuda em caso de dúvidas são atitudes fundamentais para garantir uma boa saúde visual e apoiar o desenvolvimento cognitivo.