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3 fevereiro 2022
Texto de Nuno Monteiro Pereira (urologista e andrologista) Texto de Nuno Monteiro Pereira (urologista e andrologista) Ilustração de Mantraste Ilustração de Mantraste

Loucos anos 20

​​Os confinamentos durante a pandemia podem trazer um clima de abertura sexual. Espera-se um aumento de doenças sexualmente transmissíveis.​

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​Desde o início da pandemia de COVID-19, no início de 2020, as doenças sexualmente transmissíveis cresceram significativamente em Portugal e em toda a Europa. Uma provável explicação para esse aumento foi o receio generalizado de ir a hospitais, centros de saúde e consultórios, que se imaginavam ser focos de infeção.

A mobilização dos profissionais de saúde para serviços prioritários, associados às restrições criadas para garantir o afastamento físico em espaços fechados, nomeadamente nos corredores e salas de espera, dificultaram a marcação de consultas.

A mesma razão, aliás, explica a enorme diminuição de rastreios oncológicos, da hipertensão e da diabetes, que tiveram como consequência o acréscimo significativo dessas doenças, em muitos casos com resultados fatais.

Nas doenças sexualmente transmissíveis, a redução das ações de prevenção, particularmente o rastreio do vírus da imunodeficiência humana, o vírus causador da sida, pode determinar a subida de infeções deste vírus nos próximos anos. Felizmente, a taxa de vacinação contra o SARS-CoV-2 e a progressiva perda do receio em recorrer aos hospitais e centros de saúde.​​

Com a superação do choque psicológico e recuperação da economia, é possível surgir um sentimento de euforia como aconteceu no final da pandemia chamada gripe espanhola, entre 1918 e 1921. O ressurgimento de uns "loucos anos 20" prende-se com a expectativa de comportamentos de intensa busca de entretenimento e diversão, alguma abertura e libertinagem sexual. Regressam os grandes concertos ao ar livre, estádios cheios, diminuição da religiosidade, aparecimento de novos movimentos artísticos e culturais.

A pandemia de COVID-19 tem particularidades que a tornam difícil de combater. Uma é causar uma variedade de sintomas que vão do zero, a sintomas ligeiros ou graves, até à morte. Outra é a capacidade de transmissão por pessoas assintomáticas, inclusivamente vacinadas. Outra ainda é a letalidade: mata entre 1% e 1,6% dos infetados com sintomas, bastante menos do que outras viroses, como a varíola, o ébola ou a gripe aviária H5N1.

O que está a acontecer parece estranho e pouco natural, mas os seres humanos enfrentam pragas há milhares de anos, com elevadas perdas de vidas, pesadas consequências económicas e fortes modificações sociais e culturais.

Mesmo sem vacinas e sem avanços da medicina, todas terminaram ou se atenuaram em mais ou menos tempo. O mesmo acontecerá com a COVID-19. Provavelmente, o SARS-CoV-2 sofrerá mutações que o tornarão mais benigno, sendo o seu destino tornar-se endémico, vindo a circular como a gripe ou a constipação.

Durante as epidemias, houve sempre medo, aumento da religiosidade, distanciamento social, aforro de dinheiro. Com o decorrer dos meses, ou anos, surgia o cansaço e diminuía o avesso ao risco. É isso que já começamos a pressentir na pandemia que nos aflige, sobretudo nos mais jovens, ávidos de um tempo que sentem estar a fugir-lhes: a procura de interações sociais na rua, em bares, restaurantes e discotecas; a procura de diversão e de experiências sexuais.
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