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29 junho 2023
Texto de Sandra Costa Texto de Sandra Costa Fotografia de Ricardo Castelo Fotografia de Ricardo Castelo Vídeo de Nuno Santos Vídeo de Nuno Santos

Visite Fafião, aldeia de lobos

​​​Dias 7 e 8 de julho, o lobo ibérico é a ​estrela de uma festa no Gerês transmontano.  
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​Durante dois dias, a aldeia de Fafião, integrada no Parque Natural Peneda-Gerês, acolhe o Festival Aldeia de Lobos. Os abrigos dos animais, chamados cortes, são transformados em galerias de arte, com exposições de fotografia, escultura e pintura. Nas ruas da aldeia há espetáculos de teatro e um mercadinho de produtos locais. Ao ar livre decorrem tertúlias onde gente da terra, entidades ligadas ao lobo ibérico e pastores debatem e contam estórias sobre os tempos em que se organizavam batidas aos lobos. No primeiro dia, faz-se uma queimada, para «expurgar os males». Júlio Marques, da associação Vezeira de Fafião, explica: «Põe-se um grande pote ao lume com uma bebida alcoólica forte, café e um monte de coisas, depois abafa-se o fogo e começa-se a servir as pessoas. O Festival é giríssimo!», garante. 


Júlio Marques trocou a cidade do Porto pela aldeia de Fafião. Dedica a vida à associação Vezeira

O objetivo das celebrações é sensibilizar as pessoas para o lobo ibérico, lembrando a importância de o proteger, mas respeitando o ponto de vista dos pastores e proprietários dos rebanhos, a quem os lobos punham em causa a subsistência, no passado, e continuam a provocar danos. «Queremos o bem do lobo e do pastor», explica o jovem que trocou a cidade do Porto pela aldeia. Júlio acredita que o festival ajuda a esclarecer as pessoas e a evitar extremismos. Demasiadas vezes assiste a uma grande incompreensão por parte de pessoas que vivem nas cidades para aquela realidade: «“Matavam lobos? São uns bárbaros!”. Dizem isto porque evoluíram de maneira diferente. Lá vai-se ao supermercado, aqui tem de se matar os animais», lembra. 

Até meados do século XX, as batidas aos lobos eram permitidas em Fafião, usando uma «máquina de guerra» medieval, mas muito eficaz. O fojo (armadilha) dos lobos de Fafião, construído no final do século XV e que funcionou até 1948, é o mais bem preservado da Península Ibérica, um dos mais curtos e próximos de uma aldeia. Trata-se de um fojo de paredes convergentes, para onde o lobo era atraído até cair num poço. Existe um outro tipo, chamado fojo de cabrita, em que um animal era usado como isco para atrair o lobo à armadilha. 

É junto ao muro de pedra de formato triangular que Júlio detalha como funcionava esta caça ao lobo, que envolvia a população da aldeia toda. O inverno era a altura em que os lobos se aproximavam mais do povoado (nos meses de verão os rebanhos permanecem na serra). Nos dias de nevoeiro, conhecidos como “dia de lobo”, forma-se névoa na zona em que convergem os rios Cávado e o Fafião, e a névoa é «o maior aliado do lobo». Quando era avistado ou atacava as cabras, o vezeireiro (nome dado aos pastores que guardam os rebanhos de forma comunitária) vinha à aldeia marcava-se uma reunião e fazia-se, logo aí, a batida ao lobo. Cobria-se o buraco do fojo, com quatro metros de profundidade, com vides de arbustos. Os homens que organizavam as batidas, chamados mata-lobos, permaneciam camuflados em dois buracos e o resto da aldeia separava-se em dois grupos: metade ficava do lado do Cávado, a outra do lado do Fafião, e começavam a flanquear a alcateia até à armadilha, usando paus, pedras e tachos para fazer barulho. «Podia levar horas e nem sempre havia sucesso, mas quando corria bem para a aldeia, normalmente apanhavam mais do que um lobo», conta Júlio. Os lobos que caiam no fojo eram apedrejados, empalados e levados aldeia fora, para assustar as crianças. Depois fazia-se uma grande festa: a morte do macho alfa e a dispersão da alcateia representavam por largos meses. 


Inserida no Parque Natural Peneda-Gerês, Fafião está a apostar no turismo sustentável como forma de dinamizar a aldeia e combater a desertificação

A matança aos lobos foi proibida em 1948 pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas e o fojo é hoje mantido como uma estrutura com valor antropológico, para que «as pessoas percebam o que foi a história do passado». Este trabalho de sensibilização é um dos desempenhados pela associação Vezeira de Fafião. Foram sobretudo «filhos da aldeia» os que se juntaram, há 12 anos, para criar esta associação de desenvolvimento que, desde o início, apostou no turismo sustentável como forma de dinamizar a aldeia e combater a desertificação. Fafião já é visitada por turistas de todo o mundo que vêm para conhecer o fojo dos lobos e as cascatas, percorrer os trilhos ou assistir aos eventos organizados pela associação Vezeira. O próximo é já nos dias 7 e 8 de julho. Não perca a oportunidade de conhecer esta aldeia de lobos!

 

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