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9 setembro 2019
Texto de Sónia Balasteiro Texto de Sónia Balasteiro Fotografia de Pedro Loureiro Fotografia de Pedro Loureiro

«Acordo com a luz do dia»

​​​​​​​​​O regresso radiante de uma cantora popular. 

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REVISTA SAÚDA - Como é o seu dia-a-dia? 
LENA D'ÁGUA - Acordo muito cedo, com a luz do dia, que entra por todo o lado. Ainda para mais agora, nesta época. No Inverno, acordo um bocadinho mais tarde. Antigamente era assim, quando não havia electricidade. Quando havia sol, “começava o dia”. Fico ali a ouvir música, aprendi isso com a minha mãe. Ela tinha um rádio na mesa de cabeceira para ouvir música à noite. Eu de manhã é que gosto. Depois, trato do meu gatinho. Tenho um gatinho que fica na zona dos quartos. O resto do pessoal não entra ali, mas este gatinho é especial. Tem uma doença auto-imune e magoa as almofadas das patinhas. Ele gosta de dormir comigo, mas pegar-lhe ao colo nem pensar. A seguir vou para a sala, onde tenho as minhas cadelas, o cão, o alpendre. Faço o café, ligo a Internet. Trato dos mails. Eu tenho o canal de YouTube muito recheado. Tenho 300 e não sei quantos clips, entrevistas e telediscos e videoclipes e participações... idas à televisão, concertos ao vivo. Estou nesta casa já lá vão 12 anos.  Foi a primeira casinha que vi. Apaixonei-me pela fotografia da fachada. É uma moradiazinha em miniatura mas tem um terraço impecável, um pátio. Desde miúda quis viver aquela ideia romântica dos passarinhos, das flores, das couves e da paisagem. Sempre tive isso dentro de mim...


Lena gosta de acordar cedo e ficar a ouvir rádio na cama

Tem algum cuidado especial consigo? 
Não como carne há muitos anos. Nem leite, nem iogurte, nem queijo. Faz imenso mal à saúde e a indústria é muito cruel. O Sol agora também já não tem filtros. Uma pessoa fica queimada num instante, com uma cor esquisita. E houve uma professora de canto que me disse que o mais importante de tudo era não apanhar sol na zona da cabeça. Bebo imensa água. Durmo muito bem. Deito-me e adormeço. 


Acredita que "Desalmadamente" surgiu no momento certo:  «Há muitas pessoas com saudades de me ouvir»

A revista Blitz, especializada em música, considera o seu novo disco um dos melhores do ano. 
Nunca me tinha acontecido! E eu fiz discos muito bonitos. Mas talvez tenha sido mesmo o tempo certo. Havia muitas pessoas com saudades de me ouvirem cantar novas canções.

Que memórias guarda da infância? 
A minha infância foi o meu pai [o futebolista José Águas], a música, o Benfica, os meus irmãos pequeninos, o Bairro de Santa Cruz. Quando nasci a notícia saiu no jornal, porque o meu pai era capitão do Benfica. Tenho imensas memórias de infância. Brincávamos na rua aos índios e aos cowboys, à apanhada, às escondidas. 

Era obrigatório ser do Benfica lá em casa?  
Claro. Aliás, se não fosse o Benfica nós não tínhamos nascido, porque o meu pai é de Angola. Ele já não tinha mãe nem pai aos 19 anos, quando o Benfica foi jogar ao Lobito em 1950. O meu pai tinha jeito e marcou dois golos ao Benfica. O treinador do Benfica quis que ele viesse para a metrópole. Passado um mês e picos, estava cá e, passado outro mês, conheceu a minha mãe, que era de Lisboa. Se não fosse o Benfica, eles não se tinham encontrado.

Como foi lidar com os holofotes? 
No tempo do meu pai era pacífico, porque nós estávamos quase sempre em casa, não íamos ver os jogos. Éramos três pequenitos e a minha mãe ficava em casa. Tenho fotografias de uma ou duas vezes em que fui ao estádio. 

Quando percebeu que queria cantar? 
Cantar era uma necessidade mas não era uma profissão que eu tivesse como ideia de futuro. Nunca foi. Era uma coisa simples e fácil. Lá em casa, todos tínhamos ouvido e cantávamos. 



Como eram os seus dias? 
Com os meus amigos. Um tinha uma viola, o outro tocava flauta, havia uns bongós [instrumentos de percussão], uns livros de poesia. Eu era das flautinhas, dos encontros para ler poemas e isso. E depois acontece o 25 de Abril, tinha eu 17 anos, e foi assim uma coisa incrível na nossa vida, mesmo muito incrível. Passámos do preto  e branco para a cor. 

O que mudou?  
Tudo era possível. Tanto tudo era possível que me apaixonei no ano a seguir, tive bebé e casei, tudo em menos de um ano. A Sara nasceu no último dia desse ano de 75. Não havia preocupações, tudo ia dar certo. Era o que nós pensávamos. 

Foi quando entrou para a primeira banda?  
Nessa altura, o que eu queria era continuar a estudar o mais possível, aprender e não ter de decidir, porque eu gostava de tantas coisas tão diferentes. Comecei a ir aos ensaios da banda do Ramiro (companheiro de então, que era viola baixo) com a barriguinha a crescer, com as minhas malhinhas… Havia músicas originais de rock progressivo e sinfónico em português, e eu comecei a fazer uns coros, coisa que sempre adorei fazer. E um deles disse: «Tu devias era começar a fazer os concertos connosco». Nos Beatnicks, um produtor ouviu- -me cantar e, às tantas,  recebo uns convites para gravar coros em estúdio para artistas já consagrados, como o Marco Paulo. Fiz os coros do “Eu Tenho Dois Amores”, de “Mocidade, Mocidade”, de António Calvário. Quando dei por mim, tinha iniciado sem querer uma profissão que fazia bem e de que gostava. 

 


Porquê coros?  
Sempre adorei. Em estúdio, para gravar os coros com três pessoas, tens de juntar a tua voz. Não vais para ali armado... Para fazer coros é preciso ouvir muito bem e juntares-te. É como os músicos em geral. Se um músico só quer ouvir-se e não ouve os outros, aquilo não resulta. Nas vozes, isso ainda é mais preciso. Acabei por gravar também publicidade, jingles. Eles tinham canções. Foi assim que nasceu a Salada de Frutas, que eu baptizei. Surgiu o primeiro álbum em 1980. O single o "Robot" teve um êxito incrível, em 81. A partir daí, já não podia pensar noutra forma de vida que não fosse a música.

Entretanto sai da banda… 
...E um mês depois tínhamos um álbum e um single novo. O Luís Pedro saiu comigo e formámos a Banda Atlântida. Fizemos logo o “Vígaro Cá, Vígaro Lá”, ainda em 1981. A partir daí, foram aquelas canções todas que ficaram até hoje: “Demagogia”, “Perto de Ti”, “Nuclear”, “Sempre que  o Amor me Quiser”, tantas… 

E a Salada de Frutas? 
Conheci o Zé da Ponte e o Luís Pedro, compositores. Além dos jingles para publicidade, escreviam também canções. As nossas vozes jogavam tão bem que começámos a pensar em criar uma banda. 

Que memórias queridas guarda desses anos? 
O que eu gostava mais era de chegar a casa e abraçar a minha filha. Também gostei de conhecer o país todo. 


A cantora quer acompanhar a filha e o crescimento do neto

O que lhe falta fazer?  
Preciso de fazer obras em casa, ter tempo para acompanhar o meu neto até ele ser o mais crescido possível. O meu neto tem paralisia cerebral, um problema no parto. É um menino especial que requer muita paciência, muito cuidado e muito acompanhamento. E eu quero estar cá para ele e para a Sara também. 

Ele precisa de muito apoio… 
O menino tem sessões de terapia… anda numa escola normal mas tem as suas dificuldades. A nível motor, o lado esquerdo ficou com défice. E depois tem outras coisas comportamentais que também exigem muito trabalho de família. Aos fins-de-semana, às vezes vou a casa da minha filha. Para ajudar, estender e dobrar roupa, e almoçarmos juntos. Ele gosta muito de ir a minha casa também por causa dos meus cães. Ele apaixonou-se pelos meus cães, sobretudo pela Valentina, a mais pequenota. Ela gosta de lhe lamber a cara e ele adora, fica todo contente. 

Lida bem com a passagem do tempo? 
Lido bem, sim. Às vezes, o joelho falha-me. Agora já desço as escadas um bocadinho de lado. Mas não é preciso ter a minha idade para isso acontecer. De resto, enfim,  o espelho... É como diz a canção: só o espelho é que envelhece.​

 

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