Política de utilização de Cookies em Revista Saúda Este website utiliza cookies que asseguram funcionalidades para uma melhor navegação.
Ao continuar a navegar, está a concordar com a utilização de cookies e com os novos termos e condições de privacidade.
Aceitar
15 outubro 2018
Texto de Sandra Costa Texto de Sandra Costa Fotografia de Ricardo Castelo Fotografia de Ricardo Castelo

Vestida de croché

​​​​​​Da natureza às artes, a beleza faz parte de Vila Nova de Cerveira.​

Tags
Vila Nova de Cerveira poderia ser o cenário da versão portuguesa de uma história dos livros da Anita: as pequenas casas brancas debruadas a granito, as praças decoradas com canteiros de flores impecavelmente tratadas, o castelo medieval. Parece que nada ali está fora do lugar.
 
À porta da Igreja Matriz, para mostrar a terra onde vive há 40 anos, está o médico Manuel Esteves Marques.
 

O médico Manuel Esteves Marques vive há 40 anos na vila 
 
Do monte de Nossa Senhora da Encarnação avista-se o rio Minho que serpenteia as duas margens: Portugal de um lado, Espanha do outro. O rio parece decorado pelas ilhas dos Amores e da Boega, orlado por uma linha de árvores. Ao fundo, a foz do rio desagua no mar em Caminha. A vegetação cobre de verde os montes dos dois lados: a Pena, Góios, Outeiro da Forca, Santo Antão, Santa Tecla.
 
Acima do monte de Nossa Senhora da Encarnação encontra-se a escultura "Cervo Rei", representando os animais que se julga estarem na origem do nome da vila. A obra do artista plástico José Rodrigues «é uma homenagem que fez à vila». Natural de Angola e professor no Porto, o artista viveu durante vários anos em Cerveira, num convento do século XIV que um dia, em passeio com amigos, descobriu em ruínas. Decidiu comprar e, ao longo de 40 anos, foi reconstruindo o espaço. Ali criou um museu-ateliê onde tem a sua obra, além de esculturas, desenhos e pinturas que foi coleccionando. Hoje, o Convento San Payo, ainda na posse da família está dedicado ao turismo de habitação.
 

Convento San Payo, propriedade da família do escultor José Rodrigues​ 
 
O rio é, desde sempre, parte integrante da vida de Cerveira. Historicamente na defesa da fronteira contra as investidas espanholas e francesas; gastronomicamente como berço da lampreia, do sável e da enguia. Na margem, os cerveirenses usufruem da praia fluvial da Lenta, do Parque de Lazer do Castelinho, com vários campos de jogos e actividades para crianças, e da ecopista que liga Vila Praia de Âncora a Monção.
 
São também ali as instalações do Aquamuseu, que desde 2005 mantém viva a memória do rio e apoia a investigação, através de parcerias com as universidades do Minho, Porto, Santiago de Compostela e Vigo. A exposição permanente mostra o percurso da nascente até à foz, dando a conhecer os peixes que ali vivem. O museu alberga um espólio que conta a história da actividade piscatória e um lontrário, que acolhe lontras «com necessidade de uma casa», explica o director, Carlos Antunes. Através de visitas guiadas e actividades pedagógicas, o Aquamuseu dissemina o conhecimento sobre este rio, «um dos mais importantes no que respeita aos peixes migradores, como o salmão, o sável, a enguia ou a tainha». Por ano é visitado por 20 a 25 mil pessoas, entre estudantes e turistas.
 
Este ano a vila enfeitou-se de croché para receber a XX Bienal Internacional de Arte de Cerveira. Um projecto inovador há 40 anos, que na última edição trouxe à vila mais de 100 mil visitantes, muitos estrangeiros. «A Bienal nasceu da vontade de um cerveirense, na altura presidente da autarquia, o engenheiro Lemos Costa, que quis criar um evento que trouxesse notoriedade a Cerveira», conta o director criativo, Cabral Pinto. «O objectivo foi alcançado: a Bienal pôs Cerveira no mapa. Não há muitas bienais no mundo com este número de anos consecutivos».
 

Trabalho de croché, em que participa activamente a população 
 
A Bienal Internacional de Arte teve ainda o mérito de motivar muitas outras actividades artísticas, com a participação da população. Cerveira é conhecida como ‘Vila das Artes’ e «vive todo o ano com arte, além da plástica». O artesanato tem forte tradição e artesãos e idosos trabalham todo o ano para vestir a vila de croché, numa iniciativa da Câmara Municipal e do Turismo de Cerveira.
 
Espanha está a dois passos e as duas comunidades vivem como «irmanadas». Como os restantes cerveirenses, Esteves Marques atravessa muitas vezes a ponte para o lado galego. Às vezes escolhe Goián para ir à missa. «Sinto uma grande afinidade com os galegos, assim como acredito que eles têm com os minhotos», diz. Os recursos de ambos os lados são naturalmente partilhados. Aos cerveirenses basta atravessar a ponte que liga Cerveira a Goián, no concelho de Tomiño, para ter acesso à gasolina e gás mais baratos. Esteves Marques utiliza a TDT (televisão digital terrestre) espanhola sem estranhar a diferença da língua. Nos transportes também há escolha: o comboio liga Cerveira ao Porto em duas horas e meia, mas é possível demorar uma hora com a ligação rodoviária espanhola, que liga o aeroporto de Vigo ao do Porto.
 
Também os galegos desfrutam da margem portuguesa do rio Minho: aos sábados de manhã são eles a maioria dos fregueses do mercado semanal de Cerveira, procurado igualmente por portuenses e outros com segunda casa em Cerveira, Moledo ou nas proximidades. No estacionamento do Castelinho vê-se tantas matrículas espanholas quanto portuguesas. «Preferem o Castelinho ao parque da Fortaleza, do lado galego. E há tantos vizinhos galegos a usufruir da ecopista que até nos esquecemos se estamos em Portugal ou em Espanha», graceja Esteves Marques.
 

 
O médico está convencido de que a proximidade à Galiza é fundamental para a economia de Cerveira. O turismo galego é um bom exemplo. A construção da ponte da Amizade, em 2004, veio diminuir a distância entre Cerveira e Goián a pouco mais de cinco minutos. Até 2020, a nova ponte pedonal, assinada por Siza Vieira, vai aproximar ainda mais as duas comunidades.
 
 

Notícias relacionadas
Galerias relacionadas