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23 maio 2017
Texto de Sónia Balasteiro Texto de Sónia Balasteiro Fotografia de Miguel Perestrelo Fotografia de Miguel Perestrelo

Sessenta anos de confiança

​​​​​Na F​armácia Santo António, conhecem-se os clientes pelo nome.

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Maria de França Pestana entra na Farmácia Santo António com passo firme e ar despachado. Traz um sorriso grande, onde lhe cabe a história de uma vida inteira. É quase impossível não rir enquanto se conversa com ela, tal é o bom humor que carrega consigo.

E a surpresa é inevitável quando revela a idade: 93 anos, bem vividos e cheios de energia. O segredo? Boa-disposição e exercício físico. Ainda antes de se dirigir a Paulo Sousa, farmacêutico, Maria diz, alegre: «Antes não havia água, não havia luz. Eram tempos muito duros».

Luísa Saldanha nasceu noutro lugar da ilha da Madeira, em Boa Ventura, mas veio em bebé para Santo António, de cestinho. «Já tinha força de vontade». Por isso, é natural que conheça a farmácia desde o seu início, há mais de 60 anos. «São muito bons. Recebem-nos sempre muito bem», sorri, cúmplice com o farmacêutico que conhece há décadas. Dão um abraço e sorriem como grandes amigos. «Ela é fantástica», diz Paulo Sousa.

A anciã, que passa os dias no centro de dia da paróquia, move-se com desenvoltura, mas não veio sozinha: consigo vieram duas amigas do centro, Teresa dos Santos, de 68 anos, e Maria do Rosário Sousa, de 61.

Todos os meses, desde que há 10 anos veio para Santo António, Maria do Rosário Sousa visita esta farmácia. «O atendimento», garante, «é muito bom».



O mesmo acontece com Teresa. Hoje veio pagar cinco euros que ficou a dever noutro dia. «Quando não tenho, fico a dever». Também ela veio de Boa Ventura, de onde conhece, há muitos anos, Paulo Sousa. «O pai dele tinha a farmácia muito perto da minha casa, éramos muito amigos», conta Teresa.

Entregar medicamentos a quem não tem forma de os pagar faz parte do dia-a-dia da farmácia, explica o farmacêutico. «Há muitas pessoas com dificuldades, que precisam de assistência social. E se não confiarmos, nada disto vale   a pena». Isto na farmácia da Madeira que, até há cerca de seis anos, era a que mais trocas de seringas fazia. «Eram aos milhares. Havia muita necessidade». Esses tempos estão ultrapassados.

Conhecem-se os clientes pelo nome. São, sobretudo, mulheres entre os 45 e os 65 anos a frequentar    o espaço. «Também temos recém-papás, mas são cada vez menos», refere Paulo Sousa. Esta é, diz, uma farmácia mista. Faz parte do Funchal mas goza do «privilégio de ser também uma farmácia de campo». Um cliente especial que já por aqui passou foi Cristiano Ronaldo. «Lembro-me de o ver, em pequeno, com o pai, que me disse: “Este aqui marca golos fora de série”».

Hoje, o entra e sai da farmácia é constante, mas há tempo para cumprimentar e conversar um pouco com cada um dos utentes. «Há muita proximidade», revela o farmacêutico. E confiança, acrescenta, recordando uma situação vivida por um técnico de farmácia pouco depois de ter chegado. «Lembro-me de que veio cá um utente perguntar-lhe que medicamentos deveria pedir ao médico. E eu pensei: espero um dia ganhar esta confiança». A verdade é que a ganhou – e isso nota-se.

Outro dos privilégios – «fundamental» – de que goza a farmácia é o bom relacionamento com os médicos da zona, de quem tem os números de telemóvel. «É impagável, porque com pouco esforço resolvemos qualquer questão juntos», assevera. Também a médica de família do centro de saúde, Rosa Gomes, o atesta: «É óptimo. O doutor Paulo é muito dedicado e sociável. Quando tem alguma dúvida liga a perguntar. Até pede consultas. É um verdadeiro farmacêutico de família».



O humor é outra das receitas bastante utilizadas pelos 16 profissionais da Farmácia Santo António.  O aconselhamento farmacêutico é o mais procurado, mas esta unidade de saúde também dispõe de nutricionista, fisioterapeuta e podologista.

E há também o gosto de ajudar as pessoas.  «Acreditamos que a felicidade vem desse pequeno minério. Se ajudarmos as pessoas, no final do dia já valeu a pena», diz Paulo Sousa.

É isso que sente a farmacêutica Filipa Rodrigues, que chegou à farmácia há 11 anos. Aos 37, sabe que o trabalho é abundante. A farmácia é muito movimentada, mas é de família que se trata. «Tentamos conviver fora do trabalho e temos uma relação muito próxima. É claro que é sempre uma corrida diária, mas tentamos fazer o máximo pelos utentes». 

Também de afecto se faz o dia-a-dia, como se lê nos sacos de papel da farmácia e atesta o senhor Fernando Camacho, de 74 anos. Abriu uma barbearia em Santo António há 46 anos. Mas já antes disso «vinha de propósito do Funchal», onde vive. Trá-lo a simpatia com que é atendido – a nossa conversa é mesmo interrompida por um farmacêutico que o quer cumprimentar – e também a confiança. «Levo daqui o que faz falta para a família e venho, por isto ou por aquilo, todas as semanas». Se não tiver dinheiro, paga depois. Tem tanta confiança na qualidade da farmácia que encaminha clientes do seu salão de cabeleireiro para aqui.

A dona Madalena, doméstica de 64 anos, é outra habitué. Não vem só pelos medicamentos, mas também buscar cremes e outros produtos que fazem falta lá em casa. «Esta é, sem dúvida, a farmácia da família», conclui.
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