Política de utilização de Cookies em Revista Saúda Este website utiliza cookies que asseguram funcionalidades para uma melhor navegação.
Ao continuar a navegar, está a concordar com a utilização de cookies e com os novos termos e condições de privacidade.
Aceitar
17 novembro 2017
Texto de Carlos Enes Texto de Carlos Enes Fotografia de João Pedro Rocha e Pedro Mensurado Fotografia de João Pedro Rocha e Pedro Mensurado

Puxão de calendário

​Bastonária reclama do atraso do Governo no cumprimento dos compromissos assinados.​

Tags
​Sexta-feira, 13 de Outubro. Não foi dia de sorte nem de azar, mas de clareza. A bastonária da Ordem dos Farmacêuticos convidou o ministro da Saúde para a sessão de abertura do Congresso Nacional dos Farmacêuticos e agradeceu-lhe, perante 1.800 pessoas, a criação da carreira farmacêutica hospitalar. Mas também lhe manifestou a frustração dos presentes pelo atraso do Governo no cumprimento dos compromissos já assumidos com os farmacêuticos.

«O acordo para a sustentabilidade das farmácias não pode ficar por cumprir nesta legislatura», declarou Ana Paula Martins. «O modelo de remuneração dos farmacêuticos pelos serviços que prestam está esgotado e tem que ser repensado» – afirmou – «mas também aqui o tempo se esgota». Este «também» significa que a bastonária passou em revista «vários assuntos pendentes», como os acordos com a indústria farmacêutica e o sector das análises clínicas. Defendeu apaixonadamente a rede convencionada de laboratórios de análises e patologia clínica de proximidade, «que serve os portugueses há 40 anos, com qualificação, modernização e satisfação». E prometeu guerra a qualquer tentativa de aumentar a lista de medicamentos vendidos fora das​ farmácias, com base em «falsos argumentos».

O ministro da Saúde ouviu atentamente, durante 22 minutos. Quando chegou a sua vez de discursar, logo a seguir à bastonária, sentiu que a sala esperava respostas. Adalberto Campos Fernandes até trazia «um discurso preparado cientificamente», mas decidiu mudar de planos. «Depois de ter ouvido a senhora bastonária, se me permitem, vou fazer alguns comentários a pontos muito relevantes da intervenção que fez», anunciou o ministro. «É certo que alguns aspectos que nós temos no nosso compromisso já poderiam ter andado mais depressa», reconheceu Adalberto Campos Fernandes. A crédito do Governo, destacou a carreira hospitalar, o «simplex» para a instalação de farmácias e os incentivos à dispensa de genéricos. No que está por implementar, procurou transmitir a mesma confiança. O ministro garantiu que está «em curso» a revisão da regulamentação dos turnos. Informou que decorrem «trabalhos preparatórios» da intervenção das farmácias em programas de doença e promoção da saúde, bem como para o uso racional do medicamento. Quanto a novos serviços, recordou dois projectos-piloto: dispensa de medicamentos para o VIH/sida e o novo serviço de assistência farmacêutica em período nocturno, que vai arrancar em Bragança.

O governante admitiu, até, rever o processo de internalização das análises clínicas no SNS. Também ficará atento à argumentação técnica e científica da Ordem dos Farmacêuticos contra a dispensa de medicamentos fora das farmácias. Num e noutro caso, o responsável governativo só se comprometeu com o critério. «Estamos disponíveis, com um único limite: aquilo que a evidência determinar como melhor para servir as populações e o interesse público», expôs Adalberto Campos Fernandes

A ​sala já tinha interrompido várias vezes a bastonária para a aplaudir de pé, tanto no discurso de abertura como de encerramento do congresso. Foi quando o último a falar resolveu descrever esse sentimento colectivo: – É uma grande bastonária. Não só por ter superado as expectativas, que são sempre elevadíssimas numa função como essa. Mas por ter feito isso com uma devoção integral, com uma dedicação de todos os minutos, com uma alegria de viver, com uma capacidade para ouvir, para estar atenta ao universo dos farmacêuticos portugueses, mas em diálogo constante com outros pares do mundo da saúde.

O elogio do Presidente da República levantou o congresso. Ficou confirmado que Ana Paula Martins «está a conseguir elevar a intervenção profissional e política dos farmacêuticos», descreve o presidente da ANF, Paulo Cleto Duarte. O poder político elogia-lhe a frontalidade, mas também o equilíbrio, o compromisso com os fundamentos éticos da profissão e o sentido de serviço aos portugueses.

«É possível criticar as políticas de saúde, é possível até mandar uns recados ao ministro, não perdendo o essencial do valor de uma profissão de saúde tão relevante como os farmacêuticos», dissera na sessão de abertura o ministro da Saúde. No dia seguinte, Marcelo Rebelo de Sousa aproveitou para cavar uma "discrepância" com ele, porque «a solidariedade institucional permite estas discrepâncias entre o Presidente e o Governo». «Para mim, ser farmacêutico não é uma profissão. É uma vocação», disse.

A crise que se abateu sobre as farmácias subiu ao palco com rosto humano. «Muitos dos farmacêuticos que aqui estão, senhor Presidente, perderam tudo, quando o país e as políticas se esqueceram ou não foram capazes de premiar a sua perseverança e compromisso de sentido público», enunciou a bastonária. «O que me custava, entrar numa farmácia, e dizerem-me: "Um momento, que aqui não há, mas há na farmácia vizinha"», respondeu o Presidente. Marcelo Rebelo de Sousa elogiou a reacção dos farmacêuticos à crise: «Louvo o modo como decidiram virar-se de forma ainda mais intensa para aqueles que são a razão de ser da vossa actividade e da minha função presidencial: as portuguesas e os portugueses».​