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6 novembro 2016
Texto de Maria Jorge Costa e Ilustração de Mantraste Texto de Maria Jorge Costa e Ilustração de Mantraste

O que cura também pode matar

​​​​​Um terço dos doentes entra nos hospitais por problemas relacionados com medicamentos.

Muitos medicamentos que hoje são vendidos mediante receita médica estão em vias de perder essa obrigatoriedade, mas farmacêuticos e indústria estão de acordo na necessidade de garantir que essas moléculas não saiam do canal Farmácia, como aconteceu em 2005 com a liberalização de medicamentos em pontos de venda autorizados pelo INFARMED. A venda exclusiva em farmácia de Medicamentos Não sujeitos a Receita Médica (MNSRM) é uma questão de segurança e de saúde pública, defendem.

Joana Carvalho, da Direcção da ANF, alertou para os riscos do acesso ao medicamento sem qualquer aconselhamento. «Pessoas mais velhas, com dificuldade de leitura ou iliteracia, podem comprar medicamentos num qualquer dos outros pontos de venda. Mas, nessas condições, quem os ajuda ou aconselha?», perguntou a farmacêutica. «Quantas vezes não somos nós a dar o próprio medicamento na farmácia e a assegurarmo-nos da toma correcta?», enfatizou, invocando a sua própria experiência profissional. «As pessoas não se apercebem de que a farmácia no interior do país é o mais próximo e muitas vezes o único contacto com um profissional de saúde, e por isso, a venda exclusiva em farmácia de MNSRM revela-se da maior importância», concluiu. 

A segurança para o doente e a redução de custos com a saúde por parte do Estado são outros argumentos a favor de Portugal adoptar regimes de dispensa mais adequados à especificidade dos medicamentos, como acontece na maioria dos países europeus. A abertura proporcionada pela legislação mais recente, de reclassificar alguns MNSRM como de venda exclusiva em farmácia (EF), permitirá recuperar padrões europeus de segurança e uso racional do medicamento. 

«A toma de um medicamento comporta riscos que podem resultar em problemas de saúde», afirmou Aranda da Silva, da Formifarma. «Dou sempre o exemplo do paracetamol, medicamento seguro mas que em vários países é de dispensa exclusiva em farmácias, para evitar riscos de toxicidade. No Reino Unido, por exemplo, é a primeira causa de suicídio», acrescentou o ex-presidente do INFARMED e antigo bastonário da Ordem dos Farmacêuticos. Henrique Santos, director técnico da Farmácia do Altinho, em Lisboa, lembrou que 33% dos doentes chegam ao hospital com problemas relacionados com medicamentos. 

A indústria parece igualmente apostada nos  MNSRM-EF. Manuela Cabugueira, da Medinfar, afirmou que permite recuperar valor a marcas em ciclo de maturidade ou mesmo declínio. «Quando foi permitido passar o iboprufeno 400 de MNSRM para EF, verificou-se um impulso total de vendas da marca Trifene 400», exemplificou. Por outro lado, mostrou-se sensível a argumentos a favor dos doentes, como o aconselhamento farmacêutico, e da indústria, como o acesso a publicidade e o preço livre.


Bebés em risco

Em Portugal banalizou-se o acesso sem aconselhamento farmacêutico a grandes embalagens de medicamentos. «É possível encontrar entre os MNSRM – vamos chamar de venda livre – caixas de 60 comprimidos com um grau de toxicidade brutal. Nada disto se vê noutros países, onde os fármacos vendidos fora das farmácias surgem em embalagens muito mais pequenas», refere Henrique Santos. O farmacêutico deu como exemplo as suspensões orais de medicamentos pediátricos para a febre em embalagens para três meses, «com o perigo evidente de sobredosagem».


Perigo do dia seguinte

«Portugal é o único país em que a pílula do dia seguinte está acessível sem a intervenção de um profissional de saúde», denunciou o farmacêutico Henrique Santos. Para além do grave problema de segurança, este profissional recordou que a dispensa profissional de contraceptivos de emergência é uma oportunidade indispensável de educação para a saúde, prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e encaminhamento para consultas de planeamento familiar.

Artigo publicado originalmente na Revista Saúda 08
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