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2 novembro 2018
Texto de Sónia Balasteiro Texto de Sónia Balasteiro Fotografia de Miguel Ribeiro Fernandes Fotografia de Miguel Ribeiro Fernandes

Mundo adentro

​​​​​​​Sines é lugar de mar, indústria e arte.

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Chamam floresta azul ao oceano que adentra em Sines, a cidade dos portos, da música, da indústria. A proximidade do mar às gentes da antiga vila sente-se em todo o lado. O poeta Al Berto louvou-a em “Mar-de-leva / Sete textos dedicados à vila de Sines”:
 
(…)
   …em ti acostam os barcos
   dos grandes navios do mundo
vive o peixe, agitam-se algas
   e medusas de mil desejos
 
   … em ti descansam os pássaros
   chegados doutras rotas
   secam as redes, põe-se ao sol
(…)
 
A cidade onde Al Berto viveu correspondeu-lhe com murais nas ruas e deu o seu nome à escola secundária. Um poema inscrito no chão recebe os visitantes do Centro de Artes de Sines, edifício moderno que liga a cidade nova à antiga.


Mural de Al Berto, junto ao Centro de Artes de Sines​

Muitos séculos antes, a intimidade de Sines com o oceano despertou num filho da terra o anseio de conhecer mundo. Chamava-se Vasco da Gama e ficou para a História como o descobridor do caminho marítimo para a Índia. É celebrado por toda a cidade. Dá nome a ruas, cafés, hotéis e aos doces tradicionais, os vasquinhos. Também se chama Vasco da Gama a praia, povoada de embarcações e gaivotas a competir por peixe fresco.
 
A qualidade do peixe é, precisamente, uma das dádivas da zona elogiadas pelo anfitrião, Sandro Almeida.
 
«Há sempre bom peixe nos restaurantes da costa até Porto Covo», garante.
 
Dentista há mais de uma década, Sandro vive em Lisboa mas regressa todas as semanas a Sines, há nove anos, para dar consultas. A maioria dos seus clientes trabalha no porto ou na refinaria, um dos maiores complexos industriais do país.


Sandro Almeida olha o oceano, como terá feito o navegador​​

O dentista gosta de vir a esta terra. Encontra tranquilidade nas ruas, na simpatia das pessoas, nas praias que se sucedem até Porto Covo, consideradas das mais bonitas do mundo. O modo de vida calmo ajuda-o a descansar e a recuperar da vida apressada da capital.
 
É fácil entendê-lo, ao andar nas ruas da pequena cidade, onde vive a maior parte dos 14.200 habitantes do concelho. Ao longe, ouve-se no mar o sinal inconfundível de um grande navio a anunciar-se. Alguns beirais azuis no centro histórico lembram a pertença ao litoral alentejano.​​


Rua no centro histórico de Sines​​

No castelo, Ricardo Pereira, responsável do Museu de Sines, desfia as memórias do povo desde a altura em que se tornou vila, no século XIV.
 
O intuito do monarca D. Pedro I era defender o reino dos piratas vindos do Norte de África. Impôs apenas uma condição: muralhar a povoação. «A costa era profundamente desertificada entre o Sado e o Algarve. Este era o melhor sítio, com​ condições portuárias», conta Ricardo Pereira. As casas do povoado original desapareceram com os séculos. As muralhas do castelo continuam lá, sobranceiras ao oceano. Acolhem hoje o museu e, na torre de menagem, a Casa de Vasco da Gama, onde se pode conhecer melhor a vida da família e as viagens que fez.


Recinto do castelo​

Sines era o lugar mais amado pelo navegador, que a pediu ao rei D. Manuel I como recompensa pela descoberta do caminho marítimo para a Índia. A Ordem de Santiago, porém, detinha o senhorio da vila e nunca aceitou. Vasco da Gama acabaria expulso do lugar onde nasceu.
 
Nas restantes salas do museu há histórias da costa vicentina. Contam lendas de tesouros perdidos pelos navios nas águas, guardados por um touro azul.
 
Numa vitrina, está exposta a joalharia de uma princesa fenícia, descoberta na Herdade do Gaio, nos anos 1960. A memória colectiva é partilhada também através de um objecto único: a barca de São Torpes, parecida com uma jangada. «É uma embarcação humilde mas muito inteligente», diz o guia. Na Praia de São Torpes, a poucos quilómetros, os pescadores construíam estas embarcações com o que lhes chegava do mar: paus, restos de redes. 
 
As muralhas que em tempos afastavam os forasteiros acolhem hoje os visitantes. Além do museu, recebem o Festival Músicas do Mundo, sempre na segunda metade de Julho. O encontro, entusiasma-se Ricardo, «celebra os Descobrimentos, o mundo para lá do horizonte».​​
 
Ao cair da tarde, há pessoas a passear ou a correr na ciclovia, num percurso de dez quilómetros. Sandro faz o mesmo, sempre que vem. «Gosto muito de correr e aqui há óptimas condições».
 
De manhã, junto do molhe de São Torpes, multiplicam-se pontinhos coloridos em dança sincronizada com as ondas. São os surfistas das várias escolas da zona, que aqui encontraram as condições perfeitas para aprender.
 
Ao fundo, vê-se navios, as torres da enorme refinaria e o mais importante porto de águas profundas do país.
 
A estrada em direcção a Porto Covo segue pelas praias: São Torpes, falésias da Vieirinha, Praia Grande. As revistas de viagens consideram-nas das mais belas do mundo.
 
À hora de almoço, a esplanada do Zé Inácio, restaurante conhecido pelo peixe grelhado, está cheia. Eternizada pela canção de Rui Veloso, "Porto Covo", a vila de casas brancas e beirais azuis olha para a Ilha do Pessegueiro – sobretudo da falésia com o mesmo nome.


Ilha do Pessegueiro

Não há pessegueiros na ilha mas, vista do Forte, vislumbra-se outras árvores. E rochas.
Na verdade, o lugar deve o nome ao peixe e não aos amores de um vizir de Odemira, como diz a música. A palavra pessegueiro evoluiu do latim piscatorius, dos tempos em que foi um centro de preparados de peixe.
 
O mar continua, num vaivém constante, contra as rochas. À memória chegam as palavras de Carlos Tê:
 
(…)
Ao largo as águas brilham
   como prata
E a brisa vai contando velhas
   lendas
de portos e baías de piratas
(…) 

 
 

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