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12 agosto 2019
Texto de Sandra Costa Texto de Sandra Costa Fotografia de Mário Pereira Fotografia de Mário Pereira

Mergulho fresco na terra

​​​​​​​​​​As grutas de Mira de Aire são uma obra de arte natural eleita uma das sete maravilhas de Portugal.​

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Quando atravessar a porta que dá acesso às Grutas de Mira de Aire, olhe para cima. Lá encontra uma estreita fenda – algar – que denunciou a existência deste grande complexo subterrâneo. As maiores grutas de Portugal estendem-se por 11,5 quilómetros, por baixo da vila com o mesmo nome, no concelho de Porto de Mós. Nesta região calcária de serras e planaltos há mais de uma centena de grutas e algares. O concelho parece um queijo suiço. Quem dantes andava por aqueles montes a pé corria bem o risco de ficar aprisionado num algar. 

 


Mas não foi um acidente que originou a descoberta, naquele dia 27 de Julho de 1947. Deve ter sido um ano quente e seco, e as pessoas foram à procura de água. Calculavam que ali houvesse uma fonte por verem sair vapor de água nos frios meses do Inverno. A explicação é simples: o ar húmido do interior da gruta, a 17º todo o ano, transformava-se em vapor de água quando, subindo pela fenda, entrava em contacto com o exterior.

Quando o afoito aldeão desceu ao fundo da terra terá tido uma grande surpresa. E água, aquilo que procurava, não faltava.  O maciço calcário estremenho, como é conhecido o grupo compacto de montanhas,  é o maior reservatório de água subterrâneo de Portugal.  À superfície é difícil encontrá-la, porque a natureza calcária das serras faz com que toda a água se infiltre rapidamente. A história é desfiada por Carlos Alberto Jorge, presidente do conselho de administração das Grutas de Mira de Aire. Está ligado às grutas há 48 anos e sabe tudo sobre elas. 



 Na escuridão húmida da gruta, sob o rumor constante da água, prepare-se para descer 683 degraus, que equivalem a 110 metros. Ao longo do percurso há cinco “farmácias” improvisadas, para eventuais acidentes, e seis telefones internos. Salvaguardadas as medidas de segurança, deixe-se deslumbrar com a imponência do local. Galerias amplas pontilhadas de estalactites, estalagmites, colunas (quando se juntam) e outras formações calcárias de nomes incomuns, como bandeiras ou tubulares, que traduzem rendilhados diversos, construídos ao longo de milhares de anos. Longe de qualquer sinal de telemóvel ou Internet, o tempo pára neste mundo subterrâneo pintado de tons de terra e entrecortado por riachos e lagoas.

Desde que abriram ao público, em 1974, as Grutas de Mira de Aire já foram visitadas por 16,5 milhões de pessoas. No interior são organizados espectáculos de música, dança, jantares, eventos empresariais e provas de vinhos. Até um casamento já lá se realizou. A 80 metros de profundidade, com temperatura e humidade constantes, estão em estágio 12,5 mil garrafas, numa experiência conjunta com a Casa Ermelinda Freitas. No exterior, há bungalows, um restaurante com gastronomia local e um parque aquático. Até é possível visitar um museu com fósseis encontrados numa antiga pedreira das serras de Aire e Candeeiros, chamada Praia Jurássica de São Bento.


A enfermeira Clarisse Louro, nascida e criada entre as serras

As Grutas de Mira de Aire são a grande atracção turística da região. Mas não é só debaixo daquelas rochas calcárias que se faz sentir a beleza do parque natural constituído pela serra de Aire de um lado, e pela serra dos Candeeiros do outro. «As serras fazem parte das nossas vivências e marcam a nossa identidade», garante Clarisse Louro, enfermeira de formação. Nasceu e cresceu numa aldeia da freguesia de Serro Ventoso, mas hoje vive no concelho de Alcobaça e dirige a Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria. Mantém uma ligação «de alma e coração» à sua terra. Desde que, em 2017, assumiu a presidência da Assembleia Municipal de Porto de Mós, ambiciona ver as grutas a funcionar como âncora de desenvolvimento do concelho.


Os moinhos de pedra são parte da paisagem das serras

A serra é paisagem predominante no itinerário proposto por Clarisse Louro. Por todo lado, a pedra. Nas casas, moinhos e muros.  Nas pedreiras, as cicatrizes que marcam a montanha.  A pedra continua a ser a grande fonte de receita económica da região. A calçada portuguesa da aldeia de Alqueidão da Serra é reconhecida internacionalmente. Do lado de cima, a serra faz-se sentir nas mantas coloridas, na cestaria de junco, no azeite certificado, na gastronomia, na humildade das gentes.


A Fórnea é um enorme anfiteatro natural

Paragem obrigatória é a Fórnea, «um dos lugares mais bonitos do mundo». Para chegar a este anfiteatro natural, onde correm cascatas em algumas alturas do ano, é preciso subir a pé por carreiros ladeados de ervas aromáticas: alecrim e rosmaninho. A vista é de cortar a respiração.


Reservatório de água feito de rocha, na aldeia da Mendiga

Na aldeia da Mendiga existem reservatórios de água feitos a partir do aproveitamento de grandes superfícies rochosas. Era preciso reter as águas da chuva antes que se infiltrassem no subsolo. A população preenchia todas as fendas das rochas com argila, para criar uma grande superfície impermeável que, por efeito da gravidade, canalizava a água para um depósito, que depois abastecia toda a aldeia. «Estes “telhados de água” existiam em várias aldeias da serra», explica Jorge Figueiredo, técnico camarário responsável pelo património e arqueologia.


O Castelo de Porto de Mós, onde pernoitaram D. João I e Nuno Álvares Pereira na véspera da Batalha de Aljubarrota

Não é possível deixar Porto de Mós sem visitar o seu castelo de arquitectura singular. Foi ali que pernoitaram as tropas de D. João I e D. Nuno Álvares Pereira nas noites anteriores à Batalha de Aljubarrota. A história da famosa batalha é contada no Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota, construído no exacto local onde se deu o confronto, a 14 de Agosto de 1385. A escolha deste planalto foi decisiva na estratégia militar que conseguiu travar o enorme exército castelhano. Também aqui o chão determinou o destino da região e, neste caso, de Portugal.​

 

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