RS - Quais as grandes preocupações mundiais em termos de Saúde?
FG - São sobretudo três, sem ordem: as que decorrem de alterações climáticas, sobretudo o problema das doenças transmitidas por vectores como o Zika ou o Dengue. Vamos ter um problema com vectores, que vão estar na origem de epidemias preocupantes e tem uma relação clara com o aquecimento do planeta e a maior facilidade dos mosquitos se multiplicarem. Está à vista. Temos um conjunto de problemas ligados à multiplicação de mosquitos, e é um problema grave.
No campo das doenças infecciosas estamos perante a resistência das bactérias aos antibióticos, que cresce de forma preocupante. Vai haver uma Cimeira em Nova Iorque centrada nesta questão. Corremos o risco de os antibióticos poderem perder a sua utilidade, uma vez que as bactérias que tratam não são inactivadas nem eliminadas por eles.
A terceira dimensão de preocupação em Saúde à escala global é a questão das doenças crónicas, que têm como denominador comum os estilos de vida. Seja em termos de factores de risco seja os factores protectores encontramos a mesma base: alimentação e exercício físico.
RS - O director-geral da Saúde dá o exemplo?
FG - Gosto de interpretar os indicadores dos estudos, nomeadamente as causas que matam os portugueses antes dos 70 anos. Há uma relação directa com a alimentação. Eu costumo dizer: provavelmente, ninguém sabe comer... acho que é isso que está a acontecer, nós ainda não sabemos comer. Nem nós, nem ninguém.
O homem viveu a fantástica mudança - que o separa dos animais - quando começou a cozinhar. Desde então ainda não encontrámos a forma correcta de comer. É só uma tese que ultimamente tenho defendido.
RS - Mas não é suposto os portugueses terem uma das melhores dietas?
FG - Isso é um discurso para fins turísticos. Claro que há uma base de verdade e se me falar dos ingleses... eles comem pior do que nós. Aquele pequeno-almoço devia ser proibido. Sabemos que a alimentação faz mal quando não é equilibrada mas como comer, como compensar as calorias que se perdem... os alimentos mais saudáveis, reduzir o sal isso exige um longo caminho ainda.
RS - Resistir aos sabores não é fácil.
FG - Exactamente! A indústria alimentar é um fenómeno novo. Há 100 anos o fabrico de biscoitos era artesanal e não havia alimentação infantil. Os chocolates, a oferta em açúcares, sobremesas são fenómenos novos influenciados pela indústria e pelo marketing, muitas vezes infeliz.
RS - Há muitos pediatras preocupados com o número de crianças pré-obesas e obesas que lhes aparecem com nove a dez anos.
FG - É o que lhe estou a dizer, ainda não chegamos lá.
RS - A Saúde dos portugueses está melhor?
FG - Neste momento, estamos a fazer um balanço, para apresentar muito em breve, no contexto do plano nacional de saúde e constatamos que as grandes preocupações que temos vão no sentido positivo. É importante saber que melhorámos a taxa de incidência da tuberculose, que estamos a diminuir a taxa da IVG, portanto, há menos mulheres a fazer interrupções até às 10 semanas, há menos gravidezes adolescentes, há menos crianças a morrer, há menos mortes infantis, há menos gente que não festeja 70 anos de idade. Há um conjunto de indicadores muito importantes, que avaliamos constantemente e nos incentivam a continuar. O nosso trabalho não é operacional é indicar, por exemplo, as melhores práticas para tratar a tuberculose e monitorizar se esse tratamento tem efeitos positivos, ou não.
RS - É nesse sentido que no novo Plano Nacional de Vacinação, é retirada a BCG?
FG - Precisamente. Só está indicada para determinados grupos residentes em determinadas áreas em que a taxa de incidência, de casos novos persiste ainda elevado. Na maior parte do país, trata-se de um problema que tem sido resolvido, apesar das dificuldades e das demoras. Mas resolveu-se! Portugal entrou no grupo de países com uma baixa taxa de incidência de Tuberculose, isso é importante assinalar.
RS - Portugal está ao nível dos pares europeus?
FG - Não está ao nível, está além das metas traçadas a nível europeu, em particular em tudo o que diz respeito à mãe e à criança - estamos muito à frente. Houve, de facto, um atraso na tuberculose, mas posso dizer-lhe que em muitas outras áreas, incluindo das doenças de natureza infecciosa, temos feito grandes progressos: eliminámos a Rubéola, o Sarampo. A Poliomielite - está erradicada no nosso país. Diria que estamos no bom caminho.