Revista Saúda - Teresa ou Teté?
Depende. É mais fácil ser Teté, porque temos de facilitar as coisas, não é? Mas não estou em pista, por isso o meu nome é Teresa Ricou.
Revista Saúda - Ricou não é apelido de palhaço. Como é que a família lidou com essa ideia?
[Suspira] Eles não tinham ideia. Nem eu. Isto foi uma coisa que me foi surgindo ao longo da vida, à medida que queria transformar o mal-estar em bem-estar, o pouco em muito. Quando estava de castigo nos colégios, transformava aquilo num grande arraial. Desde pequena que tenho esta coisa de fazer rir, de transformar as tragédias em coisas viáveis e interessantes. Fui percebendo que é a rir que devemos dizer aquelas coisas que as pessoas não gostam de ouvir. Tinha esse dom.
Revista Saúda - Mas de onde é que isso vem? Não foi educada para ser palhaça…
Fui educada para ser religiosa e a minha religião veio dar à arte. Nós somos uma família grande do Norte, da Granja, onde cada um nascia predestinado. Nasci para ser a rapariga religiosa, bem comportada, atenta, sempre pronta a ajudar, e tal... Mas corri África com o meu pai e com os meus sete irmãos, e isso deu-me uma perspectiva do mundo. Hoje sei de onde sou. Sou uma mistura entre o meu pai, médico franco-suíço, a minha mãe brasileira, a minha avó italiana…
Revista Saúda - Hoje sabe de onde é?
Ao fim de 33 anos de projecto, 40 de revolução e quase 80 de vida, estou a ver como volto a ser aquilo que devia ter sido e não fui: palhaço, a minha profissão, artista de circo.
Revista Saúda - Vai voltar à pista?
Quero e vou conseguir, não há dúvida. Ainda vou descer de rappel do tecto do Coliseu, tipo Mary Poppins. Quero descer de palhaço, de Teté, com uns sapatos grandes, bonitos… Vamos ver é se não me estampo lá no final. [risos] Mas também já caí tantas vezes que não há-de ser esse o problema.
Revista Saúda - Quem gostaria de ter na primeira fila, no dia em que voltar ao Coliseu?
O circo é redondo, como o mundo. É a melhor metáfora da vida. Gostava de lá ter os putos todos que ensinei. Todos ali, a aplaudir, a perceber como é, e a dizer: “Afinal ela faz”. Falta-me ter essa oportunidade, de mostrar o que era a minha profissão, porque dei a minha profissão a outros. Ensinei.
Revista Saúda - Quando percebeu que queria ser palhaço?
Lá pelos 20, 21 anos. Estava a sair da TAP, fazia muita publicidade, andava no meio do cinema a animar aquela coisa toda. A verdade é que só descobri que estava na minha profissão no dia em que entrei no Coliseu com o senhor Luciano Nobre, o grande palhaço português e chefe dos “Faz Tudo”, tinha ele 80 anos. Trabalhei depois com o senhor Totó Campos e de seguida com o senhor Zeca Elizabete, os grandes do mundo do circo. No final resolvi ficar sozinha e descobrir em mim a mulher palhaço: a Teté. Já viu a volta que fui dar para chegar à Teté?
Revista Saúda - O que é que a maquilhagem da palhaço Teté esconde da Teresa?
Não esconde. Antes pelo contrário, embeleza-me. Gosto muito dessa máscara. Fico muito bonita pintada de palhaço, apesar de ser uma coisa muito simples e ter evoluído ao longo do tempo. Primeiro, tinha umas grandes bocas, uns olhos grandes e ainda usava calças, não tinha cabeleira. Depois arranjei uma cabeleira bonita, que se levanta quando me enervo e tal… Mas já não me lembro da última vez que me vesti de palhaço.